Os acervos arquivísticos são tradicionalmente compreendidos como fontes para a pesquisa acadêmica. Por outro lado, os estudos de história da leitura dedicaram-se aos livros, bibliotecas e impressos que circularam de alguma forma entre o público. A proposta de um dossiê que tenha os arquivos como objeto implica pensá-los nas seguintes vertentes: seus aspectos formais, relacionados à produção da escrita, paleografia, diplomática, a historicidade da elaboração desses artefatos e sua preservação; os arquivos vistos do ponto de vista de sua própria estrutura e organização, como manifesto de uma lógica de dominação; os arquivos analisados do ponto de vista dos discursos, práticas e representações, ou seja, como produtores de conhecimento, mais do que fontes, agentes também do poder, pela constituição e circulação de saberes que são instrumentos de governos.
Cabe também considerar uma dimensão ainda pouco visitada pelos historiadores: a necessidade de questionar aquilo que se manteve preservado nos arquivos. As intenções de preservação de determinados fundos arquivísticos, a dimensão pessoal e a sensibilidade presente no ato de guardar correspondência privada, ou ainda, a existência de livros de copiador, originais e cópias avulsas, aspectos que apresentam indícios do significado dos documentos em um determinado tempo. Da mesma forma, quando rearranjados por agentes de uma determinada instituição, novos sentidos são criados, inibindo a possibilidade de compreender os sentidos originais de ordenamento.
Diante desse conjunto de questões, o dossiê conta com artigos que discutem o papel dos arquivos no exercício de variadas formas de poder, na tradição historiográfica, na valorização da cultura escrita, na formação de novas sensibilidades acerca da materialidade dos documentos e seus suportes, na constituição ou apagamento de identidades e memórias.
O dossiê “O arquivo como objeto: cultura escrita, poder e memória” tem como editoras Claudia Beatriz Heynemann, doutora em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisadora do Arquivo Nacional e Nívia Pombo, doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e pesquisadora do INCT Proprietas.
Vídeo do lançamento do dossiê, realizado em 5 de dezembro de 2023.