Acervo, Rio de Janeiro, v. 37, n. 2, maio/ago. 2024

História econômica do Rio de Janeiro | Dossiê temático

Café a vintém ou a tostão?

Consolidação e transformação de botequins e cafés no Rio de Janeiro (1840-1940)

Coffee for a vintém or a tostão? Consolidation and transformation of botequins and cafés in Rio de Janeiro (1840-1940) / ¿Café por un vintém o un tostão? Consolidación y transformación de tabernas y cafés en Río de Janeiro (1840-1940)

Bruno Bortoloto do Carmo

Doutor em História Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), Brasil.

bruno.bort@gmail.com

RESUMO

Por meio da bibliografia existente e de pesquisa documental, este artigo tem como objetivo buscar os caminhos que o costume do cafezinho percorreu no Rio de Janeiro. Busca compreender como comércios refinados e frequentados pelas elites adquiriram caráter popular em fins do século XIX. Em meio a essa popularização, já na primeira metade do século XX, se buscará entender como o preço do cafezinho afetava a vida cotidiana da cidade e os embates gerados pelo item mais barato dos botequins e cafés fluminenses.

Palavras-chave: cafés; botequins; Rio de Janeiro; século XX; século XIX.

ABSTRACT

Using bibliography and documental research, the aim of this article is to understand how the custom of coffee drinking developed in Rio de Janeiro. It seeks to understand how refined coffee shops frequented by the elite became popular at the end of the 19th century. In the midst of this popularization, in the first half of the 20th century, will be sought the comprehension of how the price of coffee affected the city daily life and conflicts were generated by the cheapest item in Rio’s botequins and coffee shops.

Keywords: cafés; botequins; Rio de Janeiro; 19th Century; 20th Century.

RESUMEN

A través de la investigación bibliográfica y documental existente, el objetivo de este artículo es explorar las formas en que la costumbre del cafezinho recorrió Río de Janeiro. Pretende comprender cómo se popularizaron los refinados locales frecuentados por la élite a finales del siglo XIX. En medio de esta popularización, en la primera mitad del siglo XX, se buscó entender cómo el precio del cafezinho afectó a la vida cotidiana de la ciudad y los enfrentamientos generados por el artículo más barato en los botequines y cafés de Río.

Palabras clave: cafés; botequins; Río de Janeiro; siglo XX; siglo XIX.

No primeiro dia de junho de 1922, o periódico fluminense A Noite trazia em sua quarta página a seguinte manchete: “café a 200 réis a xícara: povo indiginado atacou ontem o Café Papagaio, praticando depredações; quando a polícia chegou, só encontrou destroços” (A Noite, 1922, p. 4). Ao longo do texto da matéria, falava-se sobre o encarecimento do custo de vida na cidade do Rio de Janeiro – à época ainda Capital Federal – e a indignação popular frente ao que se dizia ser “uma alta artificial, forçada, visando manter a todo custo um preço interno em condições de contrabalançar a falta de exportação” (A Noite, 1922, p. 4). O aumento dos preços do café em pó nas torrefações e do açúcar refinado havia feito com que os donos de botequins, cafés e bares da cidade forçassem o preço do cafezinho de um tostão para dois (A Noite, 1922).

O cafezinho há muito não aumentava. Desde pelo menos 1891, mantinha-se o preço de 100 réis. Era quase um reflexo do corpo do carioca, uma extensão de seu hábito diário buscar um “níckel” para o cafezinho diário. A alta de um artigo tão barato – tido ao longo de toda a documentação analisada sempre como o mais em conta junto com o preço do bonde – causou uma convulsão popular. O redator dizia ser algo que ninguém admitia “sem sentir o sangue ferver nos vasos e os nervos a tremer em convulsões de incontida ira” (A Noite, 1922, p. 4).

A proposta geral dos botequineiros e donos de cafés era um aumento de cinquenta por cento, totalizando 150 réis o preço do cafezinho. Alvo da indignação popular, o Café Papagaio resolveu praticamente sozinho operar o aumento de cem por cento no valor. Foi às 15h que a casa foi invadida “por uma numerosa onda de apreciadores de café, os quais se abancaram às respectivas mesas e pediram a bebida” (A Noite, 1922, p. 4).

Sorvidos que foram, e depois de a sorverem, na hora do pagamento, deu-se a colisão, Ao passo que os “garçons” reclamam os $200 por xícara, os fregueses não consentiram em pagar mais de $100 réis do custo comum.

Terminou o atrito com o fato escandaloso da freguesia entregar-se a depredações, virando mesas e cadeiras, quebrando xícaras e carregando com dez açucareiros, colheres, guardanapos etc.

Realizada a sabotagem, os protestantes retiraram-se deixando por terra sete mesas, muitos cacos de xícaras, bandejas amassadas etc. (A Noite, 1922, p. 4)

Não seria a primeira vez que a população faria revoltas diretamente relacionadas ao aumento de itens cotidianos. A revolta do vintém, ocorrida entre 1879 e 1880, talvez tenha sido a mais emblemática (Jesus, 2006). O café, no entanto, tinha apenas entrado no rol de itens de objetos de consumo realmente importantes no dia a dia da população carioca. Até o início do século XIX, no Rio de Janeiro, apenas viajantes, marinheiros e imigrantes recém-chegados consumiam a bebida, que tinha pouca inserção na fatia nacional do consumidor. Consumido apenas no almoço, refeição entre 5 e 8 horas da manhã, o café era vendido por 40 réis (dois vinténs)1 até a década de 1840, servido geralmente em xícaras grandes de aproximadamente 150 miligramas (ml) e junto a uma fatia de pão. Foi nessa época que se popularizou o cafezinho, em xícaras pequenas de 90 ml, cobrando-se metade do preço (El-Kareh, 2016). Dessa data em diante, o preço da “xicrinha” foi a dois vinténs (40 réis) na década seguinte e a três (60 réis) por volta dos anos de 1880, sem que se registrassem grandes sobressaltos populares.

Foi, no entanto, em 1891 que se registrou a primeira “greve” popular (que se tem notícia) contra o aumento do preço do cafezinho, possivelmente ocasionado pela Crise do Encilhamento. O jornal fluminense O Tempo anunciava, no dia 13 de junho, que havia terminado o movimento por parte dos próprios botequineiros que aumentaram o preço da xícara a 100 réis; no entanto, foi reestabelecido ao preço anterior após pressão popular (O Tempo, 1891, p. 2). Porém, sabe-se que não foi possível resistir por muito tempo. O preço do cafezinho foi de 100 réis ou um “tostão” durante muito tempo, desde o início da década de 1890 até o ano de 1922, data do quebra-quebra registrado no Café Papagaio que se mencionou no início deste artigo.

O Café Papagaio surgiu como “Casa Papagaio” em 1876 apenas como uma pequena fábrica de torrefação que vendia os grãos moídos para consumo e administrada pela firma do português Domingos Ferreira Lino & Cia, na rua do Carmo, 30 (A Gazetinha, 1881, p. 4). Nessa época, o consumo de café caseiro ainda não era o forte desses estabelecimentos, que surgiram para atender uma demanda cada vez mais crescente de comércios do tipo que surgiam a cada esquina na cidade do Rio de Janeiro.2 Foi só em 1894 que eles abriram uma seção de “café” propriamente dito, localizado na rua Gonçalves Dias, 42 – a mesma via onde até hoje existe a Confeitaria Colombo (Diário de Notícias, 1894, p. 1).

Esse estabelecimento era, talvez, um dos mais famosos e tradicionais do Rio de Janeiro em 1922. Agora administrado pelo português Antônio Marques da Costa, ali seu dono mantinha rodas de literatos, compositores, ilustradores e jornalistas, e era tido por essas pessoas com muita estima e considerado amável com seus diletos frequentadores.3 O aumento do preço em cem por cento pelo proprietário, no entanto, não foi bem recebido por aqueles que não faziam parte dessas rodas e ali frequentavam apenas para sua xícara de cafezinho. Além disso, o protesto teve tons de escolha cirúrgica de alvo: foram todos ao mesmo tempo, com o mesmo propósito.

Mas para entender o contexto da cena descrita nos primeiros parágrafos deste artigo, precisa-se dar alguns passos atrás na história do cafezinho no Rio de Janeiro. Hoje em dia é quase impossível dissociar o café do Brasil e do brasileiro. Não só seu principal produtor, o país é – hoje – também o segundo maior consumidor em número de sacas, atrás apenas dos Estados Unidos.4 Entretanto, o consumo de café foi algo paulatinamente constituído ao longo da segunda metade do século XIX e primeira do século XX. O Rio de Janeiro reunia os principais requisitos para celeiro da cultura do café nacional: capital imperial e federal, principal porto de escoamento da rubiácea até a década de 1890 e com intensa circulação de imigrantes, viajantes e marinheiros. Todos estes indivíduos europeus, que traziam novos costumes – entre eles, o café.

As principais bebidas consumidas no Brasil – ao menos pensando no Rio de Janeiro e outros grandes centros urbanos portuários – eram a água e o vinho (El-Kareh, 2012). Das bebidas quentes, o chá tinha talvez até maior preferência que o café, apesar de frequentemente aparecerem juntos em anúncios de botequins e tavernas do início do século XIX (Algranti, 2011). O que se pode entender, no entanto, é que um modelo bastante difundido nas principais cidades europeias – o consumo de bebidas como café, chá e chocolate em espaços públicos – se transferiu aos poucos para a capital perial brasileira.

A partir das décadas de 1830 e 1840, botequins passaram a se sofisticar e adquirir as nomenclaturas de cafés e confeitarias. Eram locais com mesinhas de mármore e pés de ferro, cadeiras de palhinha (geralmente austríacas da marca Thonet ou imitando-as em estilo) e caixeiros ou garçons com chocolateiras em punho com café e leite fumegantes saídos da cozinha, servindo uma xícara “simples” ou “média”. Uma chávena dava direito a longas horas de conversa (ou palestra, termo constante na documentação), que podiam incluir partidas de jogos de tabuleiro, a leitura de alguns jornais ou apenas um charuto.5


Figura 1 – Ilustração de um estabelecimento de café no Rio de Janeiro, possivelmente o Café do Passeio Público. Semana Illustrada (1873, p. 4)

Isso aconteceu praticamente ao mesmo tempo que o Rio de Janeiro tornou-se um grande produtor de café brasileiro. Diversos fazendeiros buscaram as regiões da zona serrana (núcleo de Resende) e da baixada (São Gonçalo), o que Pedro Calmon descreveria como “impiedoso incêndio das matas, a intensa, crescente produção, a súbita inundação dos mercados estrangeiros, sobretudo da América do Norte, pelo mercado fluminense”. Para se ter uma ideia, em 1822, o café brasileiro não figurava na Bolsa de Nova York; já em 1833, os grãos da rubiácea nacional representavam um terço do café ali negociado. O aumento da produção nacional foi exponencial: rapidamente suplantou o café batavo das ilhas de Java – até então principal fornecedor do mundo depois do produto iemenita vindo do porto de Moka –, chegando no quinquênio de 1856-60 a 12,5 milhões de sacas. Com esses números, o Brasil já exportava exatamente a metade da produção mundial do produto (Calmon, 2002).

Ao mesmo tempo que o café se tornava um artigo vital para a economia de exportação do Império, novos costumes eram importados por meio do contato com imigrantes europeus, em maior medida franceses e portugueses. Costume pouco difundido no Brasil, a permanência em locais como cafés e botequins ganhou muitos adeptos nas comunidades de recém-chegados europeus. Tais estabelecimentos buscavam estabelecer laços com sua clientela, fazendo com que sua permanência fosse a mais longa possível. Por isso, esses locais primavam pela convivência cotidiana, fornecendo a seus frequentadores jogos (dominó, xadrez, bilhares etc.), distribuindo jornais e periódicos pelas mesas e anexando tabacarias aos estabelecimentos.

A presença portuguesa no Brasil remonta, obviamente, aos tempos coloniais; no entanto, a francesa começa a se observar após a abertura dos portos, principalmente a partir de 1816, quando portos como Havre, Bordeaux e Marseille passam a se conectar com as principais cidades portuárias brasileiras, facilitando enormemente o trânsito de franceses e francesas pelo território do Império (Meneses, 2024).

O padrão das imigrações para o Rio de Janeiro nesse período também foi algo a se levar em conta, tendo os imigrantes a primazia na montagem desse tipo de negócio por conta de uma particularidade – talvez única no período – de recém-chegados com hábitos citadinos. O caso de São Paulo, mais bem contemplado no que diz respeito a esse tipo de estabelecimento, mostra que, apesar de diminuta comunidade (que representava apenas oito por cento do total da população), os franceses dominavam alguns tipos de comércio, como os cafés e bilhares (Barbuy, 2009; Oliveira, 2009). O mesmo pode ser observado sobre a influência dessa comunidade no ambiente comercial. Importante notar, aliás, que existe uma falsa sensação de que comércios mais sofisticados teriam ficado nas mãos dos franceses e os mais populares, dos lusitanos (Nunes, 2000); esse é um fato comprovado pela documentação, que mostra uma proporção praticamente igual das duas nacionalidades, inclusive em tentativas de sofisticação.

A partir da década de 1870, quando os portugueses, por fim, passam a dominar a propriedade dos cafés fluminenses, começou a operar nesses estabelecimentos uma diversificação de público. Fato já ocorrido em cafés-cantantes da década de 1860, quando crônicas mostravam um público bastante variado nos can-cans regados a cafés e licores (Meneses, 2007; Fléchet, 2020), os estabelecimentos da cidade começaram a ser ocupados cada vez mais pelos “bebedores de médias com pão com manteiga”. Visto o café ser o item mais em conta do cardápio, uma infinidade de pessoas de diversas origens começa a ocupar locais considerados chics, consumindo o refinamento ao preço de um cafezinho com direito a copo d’água.

Esse artigo se insere no contexto de pesquisas sobre história do consumo desenvolvida pelo Museu do Café (Santos, SP). Por meio da bibliografia existente e de extensa pesquisa documental, empreendida principalmente nos jornais e periódicos sob guarda da Hemeroteca da Biblioteca Nacional, pretende-se perseguir a popularização de uma bebida que passou de um costume praticamente inexistente em território brasileiro para uma das mais consumidas no início do século XX – ao menos no eixo Rio de Janeiro/São Paulo, principais regiões produtoras do café na época. Com esses elementos espera-se entender como um dos estabelecimentos mais tradicionais do centro da então capital federal – o Café Papagaio – teve uma reação tão violenta por parte de seus frequentadores por conta do aumento de uma bebida que, até pelo menos um século antes, quase não se bebia naquela cidade.

Para alcançar esse objetivo, o artigo está dividido em três partes. Em um primeiro momento, serão apresentados os caminhos que o costume do cafezinho percorreu, onde era consumido, seus proprietários e, sobretudo, suas nacionalidades. Na sequência, pretende-se compreender de que forma estabelecimentos que buscavam refinamento e público das elites adquiriram caráter popular. Em meio a essa popularização, se buscará entender como o preço do cafezinho afetava cotidianamente a população do Rio de Janeiro na passagem do Império para a República. Por fim, espera-se buscar as razões para existência de eventos como aquele narrado no início deste artigo, com confusões e quebra-quebra em um estabelecimento tradicional como o Café Papagaio.

Entre botequins, cafés e confeitarias: espaços das elites e circulação de imigrantes

Rodrigues (2014) utilizou um termo bastante acertado para definir a relação da Confeitaria Colombo com a cidade do Rio de Janeiro: um local com “sotaque português e francês”. Apesar de sua inauguração ter ocorrido quase no limiar do século XIX, em 1894, essa definição é certeira para praticamente a fundação de boa parte dos estabelecimentos que tiveram como carro chefe o café desde os anos de 1830 até as primeiras décadas do século XX.

Os estabelecimentos intitulados “cafés” começaram a surgir na cidade do Rio de Janeiro entre as décadas de 1830 e 1840. Eram herdeiros de tabernas e botequins de tradição portuguesa, já disseminados desde pelo menos fins do século XVIII. No começo do século XIX, tiveram um aumento significativo em quantidade de estabelecimentos, quando começaram a aparecer as primeiras “tabernas com café” ou “tabernas com comida e café”. Eram em geral locais frequentados por escravizados, trabalhadores e com pouca frequência das elites.6 Além do chá, artigo com maior destaque, eram servidas refeições matinais acompanhadas de café e leite, principal forma de consumo da rubiácea até meados do século. Anexos a esses botequins, ocasionalmente encontravam-se no primeiro andar salões com bilhares e outros jogos, revelando locais que funcionavam como espaços de sociabilidade e lazer, “onde indivíduos de origens sociais diversas poderiam permanecer por algumas horas jogando, bebendo ou simplesmente descansando” (Algranti, 2011; Maia; Chao, 2020).

Além disso, alguns desses locais – botequins e tavernas – eram muito próximos em designação aos locais que se intitulavam restaurantes ou casas de pasto: ali os clientes poderiam se servir de comidas “de garfo”, além de eventualmente buscar pouso, pois funcionavam também como estalagens e hospedarias. Entretanto, com o tempo operou-se uma distinção, sendo botequins locais onde se serviam comidas rápidas e bebidas (alcóolicas ou não), inclusive o café (Algranti, 2011; Maia; Chao, 2020). Por sinal, os termos “botequim” e “café” – enquanto estabelecimento – muito se confundiram ao longo da documentação analisada, sendo por vezes utilizados como sinônimos.

A tradição europeia costuma não distinguir os dois termos exatamente pelo fato de, na gênese, serem muito similares. As tavernas francesas, bodegas italianas e botequins portugueses – só para citar as três principais influências fluminenses do período – se transformariam em cafés ao longo dos séculos XVIII e XIX, justamente por conta da explosão do consumo nesses países no período aludido (Heise, 1987; Lemaire, 2016). No caso português, é considerada – inclusive – como difícil uma definição eficaz do termo “café” enquanto estabelecimento, distinguindo-o do “botequim”.

Era por este termo que os cafés dos nossos dias eram denominados em períodos remotos dos finais do século XVII, séculos XVIII e XIX, tendo mesmo a perdurar pela centúria de novecentos, período em que, de forma metódica, em meados do século, os botequins foram começando a ser conhecidos, exclusivamente, pela terminologia de café, nomenclatura que já ia persistindo, em parceria com o vocábulo botequim, desde o século XIX. Este facto deve-se, em parte – como veremos mais à frente –, ao facto da bebida privilegiada, que era comercializada nestes espaços e que deu origem à sua fundação, ser precisamente o café, que alcançou grande popularidade no seio dos grandes centros urbanos. Esta infusão era preparada através da moagem do grão de café que era filtrado com o acrescento da água, dando origem ao tão precioso e afamado líquido negro e amargo. (Mendes, 2012)

Ao longo das décadas de 1840 a 1860, houve uma explosão de cafés enquanto estabelecimentos comerciais na corte imperial. Isto ocorreu concomitantemente, como se viu, à consolidação do país como principal produtor de café mundial: a produção do quinquênio de 1836-40, que era de 4,5 milhões, passou para 12,5 milhões de sacas em 1856-60 (Calmon, 2002). No mesmo período, a seção do Almanaque Laemmert intitulada Cafés, Botequins, Bilhares Etc. registrou 127 diferentes nomes de estabelecimentos com o registro de “cafés”.

Ao longo da consolidação dos estabelecimentos denominados “cafés” no Rio de Janeiro, ocorreu confusão similar ao caso português, aproximando-o do gênero dos botequins. Esta aproximação com o caso lusitano pode ser explicada pela nacionalidade de seus proprietários. Dos 127 cafés mapeados entre os anos de 1844 a 1870, apenas 87 possuíam nome de proprietário vinculado ao endereço. Destes, 33 eram franceses, 16 portugueses, quatro alemães, quatro italianos, um brasileiro, um belga e um suíço; para 35 não foi possível determinar com certeza a nacionalidade.7 Essa quantificação só pôde ser feita quando se confirmou a proveniência do nome, geralmente com documento ou conjunto de fontes que apresentasse nominalmente que o proprietário tinha laços de imigração de determinado país. De qualquer forma, é relevante salientar a predominância de franceses e portugueses como donos desse tipo de comércio.

Ainda sobre o levantamento feito, é relevante identificar as referências dos nomes (que possivelmente eram utilizados nas tabuletas de entrada desses comércios): Café de Paris (quatro ocorrências), Café Francês (duas ocorrências), Café France et Brésil, Café Français, Café de Bordéos, Café Bordelais, Café de Lyon, Café Gaulois, Café Lusitano, Café Cruz de Malta etc. Nomes com menção a cidades ou eventos europeus eram também bastante comuns. Quanto aos que faziam alguma referência brasileira, foram localizados apenas três: Café do Império (duas ocorrências) e Café Fluminense.8

Os nomes dos cafés refletem-se principalmente no grupo mais visível de proprietários desse período, que eram os franceses e portugueses. A documentação mostra que imigrantes provenientes dessa nação estiveram muito próximos tanto da criação de cafés quanto de confeitarias, o que também explicaria convergências com mais esse tipo de estabelecimento. Estabelecimentos como os das famílias Deroche e Castagnier – respectivamente, as confeitarias Águia de Prata e Braço de Ouro – foram bastante famosas no período das décadas de 1840 a 1870. Junto com os estabelecimentos do italiano Francioni e do português Castellões, esse gênero de negócio tornou-se bastante similar ao dos botequins, apesar de um refinamento maior e da busca pelo público feminino.

Jornais e periódicos das décadas de 1840 e 1850 comumente descreviam as “romarias” que aconteciam após a Semana Santa de senhoras e senhorinhas para esses comércios. No folhetim Livro de Domingo, veiculado em 12 de abril de 1857 no Diário do Rio de Janeiro, o trecho referente à festividade religiosa descreve a peregrinação às confeitarias, que disputavam entre si a decoração das vitrines para atrair maior número de clientes:

Para um grande número, porém, essas festas são apenas um pretexto para o passeio e a reunião. A visitação das igrejas anda unida à visitação das lojas de confeiteiros; na noite de quinta-feira as casas de Deroche, Carceller, Francioni e Castellões, cobriam-se de sedas, de veludos e de açúcar, e espalhavam profusamente espelhos, lustres, fióres, caixinhas douradas, de veludo, de seda; cada uma delas era um templo elegante consagrado à gulodice; cada uma se esforçava por apresentar um aspecto mais risonho que convidasse o visitante. (Diário do Rio de Janeiro, 1857, p. 1)

Apesar do afluxo descrito das “senhorinhas”, este não era seu público principal. Os cafés e confeitarias assim como os botequins tinham – pelo contrário – um público eminentemente masculino. Para os estabelecimentos que buscavam o “público familiar”,9 destinavam-se salas particulares em andares superiores e não no salão principal. No Diário do Rio de Janeiro, de 17 de janeiro de 1843, na seção Notas Particulares, uma pessoa que assinava pelo nome de Fluminense reclamava do ambiente que o estabelecimento de Francioni reservava às “famílias”:

NOT. PARTICULARES

Sr. Redactor. – Tendo lido nos jornais pomposos anúncios, convidando o público e particularmente as senhoras brasileiras a tomarem sorvetes no estabelecimento do sr. A. Francioni, rua direita n. 9, não quis trucar de falso e fui examinar pelos meus olhos, qual a realidade das promessas do sr. Francioni. A princípio, tinha-se anunciado uma rica sala, a qual se subia por soberba escada de ferro; mas infelizmente para o sr. Francioni, parece que as senhoras recusaram subir a magnífica escada, não por terem de atravessar para isso um botequim e casa de pasto, como porque uma escada de ferro em espiral, no meio de uma casa pública acessível a todo o mundo, não é das descidas mais próprias para as senhoras. É certo que quase ninguém concorreu ao salão. E o sr. Francioni percebendo o motivo, anunciou uma entrada particular para famílias. Fui também, sr. Redactor, vêr a entrada particular, e grande foi meu pasmo, sabendo que o sr. Francioni batizava o corredor e escada do seu hotel. Oh! mangação! a emenda foi pior que o soneto: pois chama o sr. Francioni entrada particular aquele corredor, em que as senhoras terão de andar aos encontros com os hóspedes do hotel, com suas visitas, com os escravos e criados dos mesmos e do estabelecimento? Na verdade o sr. Francioni aprontou a sua casa com bastante luxo; mas segundo os costumes da nossa terra, não está ela de certo própria para senhoras; e até admira que um estrangeiro afronte assim os usos do país que habita. Se o sr. Francioni quer abarcar o mundo com as pernas, pode tentá-lo; mas veja que corre o perigo de ficar escanchado; e que merece grave censura, convidar as senhoras brasileiras a tomar sorvetes em um hotel, botequim, casa de pasto e bilhar! O sr. Francioni reside no Brasil há bastante tempo e deve saber que tais franquezas não são conformes aos nossos costumes. [...] – Um Fluminense (Diário do Rio de Janeiro, 1843, p. 4)

Este trecho tem uma série de elementos sugestivos para análise. Primeiro, a existência de uma área privada para o sexo feminino para que pudessem desfrutar do mesmo que os homens na frequência desses estabelecimentos: uma xícara de café, uma taça de sorvete etc. Tal fato era generalizado, e comum aos botequins. No Café do Braguinha (ouBbotequim da Fama, como era conhecido), o português abriu, em 1857, uma “sala por cima do seu café unicamente para receber famílias e tomar sorvetes ou qualquer outra coisa” (El-Kareh, 2016).

O Botequim da Fama do Café com Leite, propriedade do português José de Sousa Silva Braga, foi talvez o estabelecimento com maior convergência entre os gêneros botequim, café e confeitaria. Além disso, visto a abundante documentação a seu respeito nos jornais e periódicos, é possível ver ao longo de seu período de funcionamento (1840 a 1870) suas transmutações: de botequim e bilhar, passando a confeitaria e sorveteria até se transformar em café-cantante (com influência das óperas cômicas que dominavam a corte na década de 1860) pouco antes de fechar as portas. Essa transformação mimetizaria todos os estabelecimentos surgidos no período, em geral com forte influência francesa (El-Kareh, 2016).

O Café do Braguinha, inclusive, ganhou grande notoriedade por estar próximo do teatro São Pedro. O fluxo das representações cênicas, que em geral ocorriam no período noturno, fez com que se forçassem os limites do dia pela noite adentro e que o café fosse consumido cada vez mais tarde. Considerado prejudicial aos nervos, bebia-se apenas pela manhã acompanhado com leite. A iluminação a gás em 1854 e os hábitos boêmios fizeram com que esse tipo de estabelecimento se associasse a casas de apresentação como o Alcazar Lyrique, o Eldorado, dentre outros. Em pouco tempo, apresentações aconteciam dentro dos próprios cafés, em meio ao apertado espaço das mesas (El-Kareh, 2016; Meneses, 2007).

Todavia, é forçoso notar que o costume das elites nacionais era antes o recolhimento que a vida pública. Portanto, espaços que buscavam refinamento vinculavam-se mais ao termo “café” ou “confeitaria”. Era premente a mudança desse traço na sociedade para que surgissem estabelecimentos frequentados não só por imigrantes ou estrangeiros de passagem, mas também pelo elemento nacional proveniente das classes mais abastadas. O anúncio veiculado pelo francês Charles Drangemont no Correio da Tarde de 19 de novembro de 1859 convidava os leitores a conhecer seu novo estabelecimento, intitulado Grande Café do Império.

“GRANDE CAFÉ DO IMPÉRIO

A ilustrada capital do Império americano ganha de dia em dia novos títulos aos respeitos do mundo civilizado. A extensão de seu comércio e o gosto refinado de seus habitantes atraem-lhe o que ali se produz de mais precioso. O artesão e o artista premiado e coroado pelos povos mais cultos vêm de toda a parte submeter seu artefato ou seu gênio ao contraste fluminense.

Os costumes nacionais, conservando seu carécter de franqueza e lealdade, despiram-se de preconceitos pueris; e assim o honrado negociante, o zeloso servidor da nação e o folgazão o capitalista não escrupulisam já de achar-se com seus colegas ou amigos em torno de uma mesa redonda, de um bilhar, de um bufete de café, para trocarem suas ideias e refociliarem-se dos cuidados da vida, quando tais estabelecimentos são criados pelo bom gosto e mantidos pela probidade.

Em tempos que não vão longe estavam tiradas as inquirições VITOE ET MORIBUS do indivíduo de quem se dissesse: – É UM HOMEM DE BOTEQUIM; mas é que então tais casas só podiam receber as espumas da sociedade fluminense. Atualmente a cidade do Rio de Janeiro pode oferecer ao nacional e ao estrangeiro mais caprichoso um lugar de honesto repouso e passatempo, que não receia comparações com os mais famosos cafés de Paris, de Turim e de Nápoles, nem com as tavernas de Londres.” (Correio da Tarde, 1859, p. 4)

A grande e longa citação novamente se faz necessária por conta da riqueza de detalhes que Dangremont utilizou em seu anúncio, não se limitando apenas a descrever o ambiente interno ou aquilo que seria servido pelo seu comércio. O francês se ocupou de dois, três parágrafos inteiros para o que era praticamente uma missão civilizatória dos costumes fluminenses por parte desses novos estabelecimentos. Todavia, o que se pôde ver foi uma grande apropriação desses espaços de elite por meio das classes médias urbanas, como mostraremos na seção seguinte.

Simples ou com leite? Predomínio português e popularização dos cafés-botequins

É exatamente a partir das décadas de 1870 e 1890, quando os cafés se firmam na paisagem urbana fluminense, que começa a operar uma mudança de público. Como pôde ser visto no anúncio de Charles Dangremont, suas referências se inspiravam nos principais estabelecimentos de Paris, Viena e Turim. É forçoso dizer que também se depreende das fontes analisadas importante influência os cafés de cidades portuguesas como Lisboa e Porto – que talvez marcassem os imigrantes portugueses mais que aquelas cidades; essa informação, no entanto, aparece de forma muito mais implícita do que que explícita na documentação.

Em seu livro de 1935, Rio de Janeiro do meu tempo, o cronista Luís Edmundo descrevia dessa forma o famoso “Café do Rio”: “Abrindo para a rua Gonçalves Dias, tem oito portas, e duas para a rua do Ouvidor. [...] Mesas de pé-de-galo, com tampas de mármores que ainda se importam de Lisboa”. Continuava dizendo que cadeiras de fábrica Thonet, “ainda vindas da Áustria, com fundos de palhinha, quiçá, um tanto cambaias e sovadas pelo uso” (Edmundo 2003).

O Café do Rio era propriedade do português João Ignácio de Brito. Proprietário do antes intitulado Café da Cascata, aberto em 1886, fundaria três anos mais tarde o “Cafedório”, assim chamado por seus frequentadores por conta das apertadas letras de sua tabuleta fixada na fachada. Esse estabelecimento, junto com o Café do Amorim e o Café do Papagaio, propriedade dos também portugueses João Augusto Pereira Amorim e Domingos Ferreira Lino, foram os mais famosos e tradicionais da cidade do Rio de Janeiro até as primeiras décadas do século XX.

Todos os três eram descritos como Luís Edmundo o fez com o “Cafedório”: mesinhas com tampo de mármore e pé de ferro portuguesas, cadeiras austríacas ou vienenses de madeira com palhinha e, em geral, ornados com grandes espelhos e pinturas de tinta a óleo nas paredes.


Figura 2 – Interior do Café do Rio, c.1903. Fotografia de Augusto Malta. Acervo Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro (MIS-RJ)

Mesmo os cafés mais refinados tinham uma clientela variada. A documentação leva a entender que dependiam mais do público de classe média do que das elites. O Café Carceller, localizado na rua Direita n. 7 e 9, eternizado em romances, contos e crônicas de Machado de Assis e José de Alencar, talvez tenha sido um dos primeiros redutos de literatos do Rio de Janeiro no século XIX. Na década de 1870 (quando seu nome já tinha mudado para Café Cruzeiro), foi apelidado de “Olimpo” por conta de seus assíduos frequentadores.

TAM-TAM!

Os deuses pesados, sorumbáticos e graves como um centurião, baixaram do Olimpo; estão agora estragando o coturno Melié ou Cathiard nas pedras das calçadas, ou então recolhem-se em concílio fácil e ameno, e abafam o sentimento nostálgico da ambrosia com seis goles de café, ou uma cajuada no Café Cruzeiro.

É aí que eles pairam; o pobre Café Cruzeiro! O antigo centro das alegres provas escolásticas e das discussões variadas, onde cada ideia agreste e fabulosa rebatia-se suave e macia no espírito daqueles que hoje são outros, e nem sequer pensam mais nos bons tempos. Era então uma quinquilharia de pensamentos, um charivari de coisas. Falava-se de matemática com um dogmatismo de assombrar; diante da mesa mármore, falavam-se em coro do belo, em ária das revoluções, em dueto de uma novidade; bebia-se café e licor…

Depois vieram eles, os intrusos, os deuses, que até então não bebiam café e foram direitos ao Felix. Sentaram-se a uma mesa e principiaram as profanas libações, e hoje ao redor da mesa, curvados sobre o cabo do guarda-chuva com medo de sujar os cotovelos, sentados com jeito e a falarem baixo, fazem um pouco de Olimpo e depois vão-se para casa.
Temos o sr. Taunay, louro como uma sempre-viva, a falar do Paraguai e da retirada da Laguna. Fala por si e pelo Instituto Histórico.

O sr. Zaluar apoia com tiradas de [ilegível], e o dr. Borja Castro vai acrescentando vírgulas e pontos de admiração na mesma toada. Às vezes é o dr. Lossio, fumando um cigarro eterno e mal-feito. No dr. Lossio nota-se que o chapéu vai à bolina, o nariz marca o norte do chapéu, e o cigarro o norte do nariz, é ele a regra de proporção com duas pernas, seguindo sempre para um lado. É uma proporção que não quebra esquina.

Ainda há:

O sr. José de Alencar, a quem lhe falam do seu poema e ele responde que o seu poema é d’ele. O sr. Serra que vai redigindo tudo aquilo até chegar o sr. Machado de Assis.

O sr. Peçanha do Diario contrabalança os méritos do sr. Serra; cada pilhéria que deita, leva o cunho do seu sinete de coralina, que lhe faz muito parecido com os incríveis da regência.

Chega sempre com os dedos cheios de tinta.

E o sr. Taunay ouve-os com a sisudez de uma Juno de calças.

Ele é ela daquele Olimpo!

Às vezes chegavam-se uns deputados, que julgam a corte o paraíso prometido por Maomé, e que depois de consegui-lo, gozam-no do melhor modo.

Há ainda uns acólitos que só servem para segurar nas galhetas da pilhéria, e apartejam com algum despropósito, a propósito de tomarem uma xícara de café. Ha alguns; o autor das Cousas da Calabria, por exemplo…

E depois vão para casa os heróis olímpicos.

quinta essência

De átonos, da luz fósmea

BASTOS (Comédia Popular, 1877, p. 2)

O que é relevante sobre essa crônica é a forma como o autor se refere aos frequentadores do Carceller/Cruzeiro: o “Olimpo” – ao menos em teoria – deveria ser inalcançável aos mortais e somente acessível a divindades. Esse local, apesar de obviamente voltado para as elites, era relativamente acessível, pois era público e o ingresso a ser pago era uma simples xícara de café. Em 1935, Luís Edmundo chamava atenção: boa parte da classe média baixa e trabalhadora fluminense utilizava-se do subterfúgio do cafezinho para ter acesso a locais onde, supostamente, não poderiam frequentar. O refinado café dava lugar ao “botequim vulgar”, local no qual novamente se confundiam as duas designações; decadente, populares tomavam elegantemente – porém de costas para rua, para não denunciar a simplicidade de seus almoços – um café com leite com pão.

Sala de loja vasta, funda, mostrando um tapete de oleado, com ramagens, cobrindo-lhe todo o assoalho, por certo muito gretado e velho, mesas com tampo de mármore negro e guarnições murais do mesmo mármore, compondo a linha da decoração severa, sóbria, e ainda não abastardada pelo delírio frívolo do famoso art nouveau.

Em 1901 o café decaiu; já não tem mais terrasse, nem tapete de oleado, nem fama. É um botequim vulgar, onde os elegantes tomam, de costas para a rua, uma famosa “média” de café, leite e pão quente, um pão-de-família, enorme, valendo por um sólido almoço e custando, apenas, três tostões.

No sobrado, o restaurante com sala para banquetes e um mundo de recordações! — Era aqui que o sr. d. Pedro II, moço, pela semana santa, após correr as igrejas, no dia da visitação, tomava sempre, o seu sorvete de caju…. Acolá, as armas do Bragança… Naquela mesa, um dia, Gaspar da Silveira Martins e o poeta Rosendo Muniz Barreto… Os muito jovens pintores Visconti e Batista da Costa, por vezes, sentam-se acolá […]. (Edmundo, 2003).

A citação de Luís Edmundo sobre o Carceller/Cruzeiro (que ainda teve como nome Café do Globo antes de fechar em fins do século XIX) se faz necessária pela rememoração da peregrinação das senhorinhas às confeitarias na Semana Santa, fato que chamava atenção inclusive do imperador d. Pedro II. Esse fato, talvez, dê a dimensão do refinamento e público que esses locais almejavam. Por outro lado, a “decadência”, a que Luís Edmundo se referia em suas crônicas sobre os cafés do Rio de Janeiro de seu tempo, nada mais era que a transição da ocupação desses locais por pessoas – como se diria à época – sem um tostão furado no bolso (Edmundo, 2003).


Figura 3 – Machado de Assis no terraço do Café e Confeitaria Castellões, que hoje é a Confeitaria Colombo. Fon-fon, Rio de Janeiro, 4 maio 1907. Acervo Biblioteca Nacional

São muitas as situações que Edmundo citou sobre a vida dos cafés nesse período de transição. Quando descreveu o Café de Paris, dizia que as cadeiras importadas da Áustria já estavam com a palhinha afundada. O lugar, entre os espelhos, tinha quadros — segundo o próprio autor — de “qualidade duvidosa”. Um dia, um dos frequentadores assinou em um deles, um quadro de um pintinho saindo da casca, o nome de João Timóteo da Costa. A troça foi além e divulgaram nos jornais a seguinte nota: “O jovem artista sr. João Timóteo expõe, hoje, numa das paredes do Café Paris, o seu melhor trabalho.” Ainda de acordo com o autor, a nota foi uma surpresa “até para o dono do café”. Não é preciso dizer que o pintor não ficou nada contente com a brincadeira (Edmundo, 2003). Uma coisa que fica clara nessa passagem é a circulação de artistas por esses cafés, que ia além do tal “Olimpo”. João Timóteo era, no fim do século XIX, um jovem pintor negro de família pobre que angariou fama e circularia pela Europa apenas nas primeiras décadas do século XX (Edmundo, 2003).

Essa circularidade de famosos e populares se tornava mais evidente quando Luís Edmundo descrevia os famosos “prontos”: essa é uma expressão que ficou famosa por conta de Clímaco Barreto, o qual – dizia – bebia sem dinheiro e, na hora de pagar, levantava os braços pedindo aos caixeiros ou garçons que o cobravam: “Pronto! Revistem-me, agora, e vejam se descobrem por aí, em qualquer bolso, um níquel” (Edmundo, 2003).

Essa, no entanto, não era a única tática descrita por Edmundo dos malandros boêmios frequentadores dos cafés na virada do século XIX para o XX. Outra forma de ocupar esses locais, sem necessariamente pagar, era frequentá-los em grande número. Visto o costume desses estabelecimentos em oferecer um copo d’água junto ao cafezinho, grupos numerosos de oito a dez pessoas adentravam o local e pediam apenas um par de cafezinhos; os copos d’água da casa, no entanto, eram servidos a todos no grupo. Esse é, inclusive, o costume que fez com que Noel Rosa, assíduo frequentador do Café Papagaio, escrevesse nos versos da música Papo de botequim, de 1935, em seu tom de pobretão exigente: “Seu garçom faça o favor de me trazer depressa / uma boa média que não seja requentada / um pão bem quente com manteiga à beça / e um copo d’água bem gelado”.

Entre cafés-sentado e cafés-em-pé: transformação do costume do preço do cafezinho

A partir da citação de Noel Rosa, assíduo frequentador do Café Papagaio, volta-se para a confusão descrita no início do artigo. Na continuação da matéria dizia-se sobre “soluções” que os botequineiros e donos de café tomaram antes de resolver aumentar a xícara de café. Certo dia – dizia o redator da matéria – a boemia frequentadora do Café Belas Artes, que era importante reduto de artistas plásticos buscando notoriedade – teria sido surpreendida pela substituição das antigas cadeiras de madeira com encosto de palhinha por “uns tamboretes. Julgavam os proprietários do café que a freguesia assim, sem encosto, demorasse menos. Enganaram-se redondamente. Com pouco tempo, os tamboretes estavam quase todos furados” (A Noite, 1922, p. 4).

Esta, no entanto, se tornou uma crítica recorrente dos donos de estabelecimento: era impossível se manter um comércio apenas com o valor de um cafezinho “e muita palestra”. Não importava o quão tradicional fosse o local, o período entre as décadas de 1920 e 1940 foram decisivos para a transformação na forma de se consumir cafezinho na cidade do Rio de Janeiro. Na virada do século XIX para o XX, surgiram os “cafés de uma porta”,10 locais que transformaram o balcão de um espaço de comunicação da cozinha com os atendentes das mesas em um espaço para servir as pessoas em pé. Eram herdeiros diretos da tradição dos quiosques, locais onde se vendiam cafés e outros tipos de bebidas e comidas rápidas populares.

Um pouco depois, na década de 1920, São Paulo começou a viver a euforia dos famosos “expressos”. Também se utilizando de balcões, mas subvertendo a lógica de preparo do café nas cozinhas, o uso de máquinas importadas italianas movidas a vapor fez com que o espaço fosse utilizado para aumentar a rotatividade do estabelecimento. “Aos poucos o público habituou-se aos tais estabelecimentos, onde não havia cadeiras nem mesas, e todos tinham de se encostar no balcão para sorver o café” (Monteleone, 2008, p. 74).

No Rio de Janeiro, a transformação dos tradicionais “cafés-sentado” – como eram chamados os tradicionais cafés-botequim – veio a custo de muitas reclamações. Importantes pontos de reunião da boemia artística, fossem músicos, jornalistas, literatos ou artistas plásticos, eram locais onde não só se encontravam como, também, produziam. O balcão fez com que esses espaços, aos menos ligados ao consumo de café, fossem aos poucos desaparecendo na paisagem urbana do Rio de Janeiro. Na página 48 do Correio de Manhã, do dia 3 de fevereiro de 1952, os balcões de mármore eram vistos como uma realidade melancólica e a substituição das mesinhas e cadeiras, vista com pesar:

BALCÃO DE MÁRMORE

Já não há mais mesas onde se derrearem os fregueses sem pressa, onde se traçar croquis de desenhos, onde se compor e ensaiar sambas na caixa de fósforos. Enfim, não há mais poesia nos “cafés”. O balcão de mármore substituiu as velhas e pesadas banquetas. O homem apressado que toma o seu cafezinho em pé desconhece o seu vizinho. O dono do estabelecimento perdeu a intimidade para com o freguês. Já não se aluga uma cadeira por tempo indefinido a troco de duzentos réis. É que a vida ficou difícil para todos, inclusive para o negociante. (A Noite, 1922, p. 4)

Até essa data o preço do café de consumo interno não gerava tantas preocupações ao governo federal. Tentava-se controlar a situação das sucessivas superproduções e da baixa busca do mercado internacional pela rubiácea. Acordos de compra de excedentes e estoques governamentais foram feitos no começo do século XX, como foi o caso do Acordo de Taubaté assinado em 1906 (Ribeiro, 2011). Entretanto, a grande crise que abateu o mercado de exportação cafeeiro a partir da década de 1930, resultado direto crise da Bolsa de Nova York, fez o principal comprador do café brasileiro diminuir as importações a quase zero (Furtado, 2007). Pelas fontes analisadas pode-se entender que o governo brasileiro teve a dupla solução de aumentar a qualidade do produto de exportação brasileiro (na época chamado de “cafés finos”) e, com a compra do excedente, subvencionar fábricas de torra e moagem da rubiácea para forçar, consequentemente, o preço do cafezinho em estabelecimentos públicos para baixo.

Ainda segundo o conjunto de fontes analisadas, nos periódicos de 1840 a 1930, pode-se perceber que ocorreu uma situação sui generis: em 1931, o preço do cafezinho, pela segunda vez na história, baixou ao invés de aumentar. A primeira seria operada por volta de meados da década de 1850 pelos próprios donos de botequins e cafés do Rio de Janeiro, buscando aumentar o consumo de seus clientes e prolongar a permanência em seus estabelecimentos, diminuindo, assim, tanto o preço quanto o tamanho da xícara pela metade. O segundo, por determinação do governo Vargas, tinha por objetivo exatamente a manutenção desse modelo de negócio que passou a viver quase que exclusivamente da venda do cafezinho, mas seus proprietários reclamavam ser insustentável.

Quadro 1 – Preço do cafezinho no Rio de Janeiro entre 1830 e 1947

Datas aproximadas

Volume aproximado da xícara

Valor da xícara

1830-1854

150 ml

40 réis

1855-1873

90 ml

20 réis

1874-1891

90 ml

60 réis

1892-1926

90 ml

100 réis

1826-1930

90 ml

200 réis

1931-1936

90 ml

100 réis

1936-1947

90 ml

200 réis

Fonte: autoria própria.

Entretanto, esse movimento varguista que buscava aumento de popularidade entre os consumidores não agradou os proprietários de cafés, bares e botequins. Mesmo com a subvenção do valor por parte do governo federal, o conjunto de fontes analisadas apresentou uma série de lockouts ao longo das décadas de 1930 e 1940. Os donos desses estabelecimentos ameaçavam constantemente o fechamento, mudança de carro-chefe do cafezinho para outros tipos de artigos (como chá, chocolate instantâneo, sucos etc.), assim como o encerramento dos principais pontos de encontro do centro do Rio de Janeiro.

Em fevereiro de 1931, praticamente todos os jornais em circulação na capital federal traziam manchetes como as seguintes: “A xícara de café a $100 réis”, dizia o periódico A Esquerda, de 2 de fevereiro de 1931, acompanhando como subtítulo “Às 5 horas da tarde haverá um comício “pró café 100 réis” (A Esquerda, 1931, p. 6). Houve também longas e constantes matérias intituladas “O preço do café pequeno” feitas no Diário de Notícias nos dias 14 e 18 de fevereiro e 7 e 8 de março de 1931 (Diario de Notícias, 1931, p. 5; 1931, p. 5; 1931, p. 5; 1931, p. 3). Em um desses artigos, transcreveu-se o seguinte diálogo:

Em um estabelecimento do centro urbano deu-se, aliás, um caso que reflete o azedume com que foi recebida a medida. Um freguês tomou um café e pagou $100 réis. O “garçon”, porém, exigiu o pagamento de $200 réis.

– Mas a tabela… – obtemperou o freguês.

– Não temos nada com a tabela – respondeu o “garçon” – se o senhor quer café a cem réis vá tomá-lo na Prefeitura. (A Esquerda, 1931, p. 6)


Figura 4 – Trecho de uma das matérias “O preço do café pequeno”, veiculadas entre fevereiro e março de 1931. Diário de Notícias (1931, p. 5)

Como no caso ocorrido no Café Papagaio, descrito no início deste artigo, uma tática bastante comum do público era a de simplesmente pagar o preço anterior ao aumento. O costume era beber e depois pagar, em geral deixando o “níquel” em cima da mesa ou balcão. Não raro, o café era bebido, a moeda deixada e o cliente já ia longe quando o atendente notava a falta da moeda para complementar o valor acrescido do aumento.

A partir de então, uma longa batalha era travada entre governo, botequineiros e consumidores. O primeiro instituía o valor da xícara ao nível considerado justo a partir do subsídio; já os donos de estabelecimentos tentavam aumentar o valor do cafezinho seja pelo valor elevado, seja por outros subterfúgios como diminuição do volume da xícara ou substituição da bebida por outros artigos; e, por fim, os consumidores tentavam burlar os aumentos ou, em situações extremas, realizar piquetes e quebra-quebras em estabelecimentos de maior visibilidade e circulação. O aumento das xícaras era, entre eles, talvez a maior reclamação.

Preferem pagar multa a aumentar o tamanho da xícara de café

RIO, 20 (“Correio”) – Os proprietários dos bares e cafés da cidade, resistindo à Comissão Central de Preços, preferem pagar as multas a aumentar o tamanho das xícaras. Só em janeiro a arrecadação das multas se elevaram à cifra de Cr$96.000,00 arrecadados dos infratores. Persiste, outrossim, o movimento no sentido de ser aumentado o preço do cafezinho, [e] da média, sob o pretexto do encarecimento do produto. (Correio Paulistano, 1947, p. 3)

Tanto reclamações como abusos e descumprimento de normas tornaram-se comuns mesmo no cenário onde os estabelecimentos intitulados “cafés-sentado” estavam já praticamente extintos da paisagem urbana carioca. Com os balcões dominando os espaços de servir cafezinho, os preços continuaram subindo e a busca por lucro também. Embates entre clientes e donos de comércio foram registrados na documentação por motivos de aumento e não cumprimento das normas governamentais até, pelo menos, a década de 1960. Estes eventos não se tornaram restritos à até então capital federal, sendo também notados em outros grandes centros urbanos, como São Paulo e Porto Alegre.11 A transformação dos ambientes com mesinhas e cadeiras também seria, aos poucos, observada nas demais capitais onde o tipo de comércio no estilo “café-sentado” se estabeleceu. O preço cafezinho, portanto, não pararia de crescer, e seria cada vez mais tomado apressadamente em frente ao balcão.

Considerações finais

Populares na Europa desde o século XVIII, os cafés aos poucos tomaram conta do cenário urbano fluminense na primeira metade do século XIX com a circulação intensa de migrantes internacionais recém-chegados. Cafés e confeitarias proliferaram pela corte imperial ao longo das décadas de 1830 a 1860. Esses estabelecimentos tiveram uma forte influência de franceses e portugueses, sendo frequentados por imigrantes europeus, mas também viajantes e marinheiros que circulavam pelo Rio de Janeiro.

Esses locais também tinham uma forte relação com a comunidade francesa, sendo seus principais proprietários dessa nacionalidade, visto que buscavam um refinamento que atingisse as classes mais abastadas da corte imperial, procuravam vender artigos importados e serviam o café à moda europeia.

O “sotaque” francês e português desses locais se traduzia ainda nos ambientes internos. Por um lado, mesas de mármore, famosas na tradição dos botequins portugueses. De outro, cadeiras de palhinha de madeira, grandes espelhos e chocolateiras para acondicionamento do café e do leite provenientes da tradição francesa. Juntos a tudo isso, os divertimentos: companhias de teatro cômico, bilhares e jogos de tabuleiro completavam o característico espaço dos cafés e confeitarias. Tudo isso resumia-se em espaços que buscavam longa permanência de seus frequentadores.

O Rio de Janeiro, então, constituiu uma prolífera cultura do café na virada do século XIX para o XX. Importantes rodas de literatos, músicos e artistas plásticos se formaram e aconteciam de forma regular em cafés e confeitarias cariocas. Donos buscavam manter cativos seus clientes mais prestigiosos, pois estes faziam com que seus estabelecimentos fosses elevados a outro patamar.

Com o tempo, locais que se destinavam às elites foram ocupados pelas classes médias urbanas. Pessoas que se aproveitavam do preço diminuto do café – item mais em conta do cardápio – para usufruir de espaços refinados aos quais dificilmente teriam acesso com seu poder aquisitivo. Sobre este assunto, o cronista Luís Edmundo trouxe em sua publicação Rio de Janeiro do meu tempo diversas caricaturas da época em seus textos, como os bebedores de média de costas para rua ou os “prontos!” que comiam e bebiam à larga sem ter dinheiro para pagar.

Por fim, apesar de diminuta bibliografia para esta seção do artigo, sabe-se que este modelo de comércio sumiu após a segunda guerra mundial. Os chamados “cafés-sentado” foram substituídos pelos de balcão, intitulados “cafés-em-pé”. Embora rodas de conversas pudessem trazer grande prestígio para estabelecimentos que angariassem literatos e artistas de renome, eram grandes as reclamações sobre as dificuldades em se manter um estabelecimento com o preço de “apenas um cafezinho e muita palestra”.

O preço do café gerou muita animosidade nos primeiros trinta anos do século XX, tanto entre a clientela desses locais como com proprietários. Visto esta ser outra lacuna na bibliografia, buscou-se, em meio ao conjunto de fontes arroladas na pesquisa, entender como aconteciam os embates entre botequineiros e donos de cafés, frequentadores e o próprio governo federal. Com as leis criadas para congelamento e subsídio do preço do cafezinho pelo governo Vargas, um novo capítulo para o entendimento dessa relação carece de estudos.

Por fim, é forçoso notar a seguinte ironia: proprietários dos espaços que inicialmente buscaram fidelizar os clientes pelos longos períodos de permanência se revoltaram contra esse modelo de negócio. Cadeiras de madeira e mesas com tampo de mármore foram substituídas por longos balcões, que passaram a ser usados para servir café e não como anteparo de bandejas e comunicação com a cozinha. Os que mantiveram mesas, ou mudaram de ramo ou fecharam. No Rio de Janeiro depois dos anos 1940, mesinhas, cadeiras e palestras só em restaurantes ou lanchonetes; café, só em pé.

Fontes

A 60 RÉIS. O Tempo, Rio de Janeiro, 13 jun. 1891, p. 2.

A CHICARA DE CAFÉ A $100 RÉIS. A Esquerda, Rio de Janeiro, 2 fev. 1931, p. 6.

CAFÉ A $200 A CHICARA. A Noite, Rio de Janeiro, 1 jun. 1922, p. 4.

CASA DO PAPAGAIO. A Gazetinha, Rio de Janeiro, 8 jan. 1881, p. 4.

DEPREDADO O CAFÉ PARAVENTI PORQUE AUMENTO O PREÇO DO CAFÉZINHO! Correio Paulistano, São Paulo, 6 fev. 1947, p. 12

FOLHETIM LIVRO DE DOMINGO. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 12 abr. 1857, p. 1.

GRANDE CAFÉ DO IMPÉRIO. Correio da Tarde, Rio de Janeiro, 19 nov. 1859, p. 4.

NOTÍCIAS PARTICULARES. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 17 jan. 1843, p. 4.

O DESAPPARECIMENTO DE UMA FIGURA POPULAR DA CIDADE. Diário da Noite, Rio de Janeiro, 31 maio 1937, p. 9.

O PREÇO DO CAFÉ PEQUENO. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 14 fev. 1931, p. 5.

O PREÇO DO CAFÉ PEQUENO. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 19 fev. 1931, p. 5.

O PREÇO DO CAFÉ PEQUENO. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 7 mar. 1931, p. 5.

O PREÇO DO CAFÉ PEQUENO. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 8 mar. 1931, p. 3.

PREFEREM PAGA MULTA AUMENTAR O TAMANHO DA XICARA DE CAFÉ. Correio Paulistano, Rio de Janeiro, 21 fev. 1947, p. 3.

QUANDO O “ALMÔÇO DE POBRE ERA CAFÉ. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 3 fev. 1952, p. 48.

REAÇÃO POPULAR CONTRA O AUMENTO DO “CAFÉSINHO”. O Jornal, Rio de Janeiro, 13 nov. 1943, p. 9.

SEM TÍTULO. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 15 out. 1894, p. 1.

SEM TÍTULO. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20 nov. 1900, p. 4.

TAM-TAM! Comédia Popular, Rio de Janeiro, 21 nov. 1877, p. 2.

Referências

ALGRANTI, Leila Mezan. Tabernas e botequins: cotidiano e sociabilidades no rio de janeiro (1808-1821). Revista Acervo, v. 24, n. 2, p. 25-42, 2011. Disponível em: https://revista.arquivonacional.gov.br/index.php/revistaacervo/article/view/349. Acesso em: 30 nov. 2023.

BARBUY, Heloísa. Comércio francês e cultura material em São Paulo na segunda metade do século XIX. In: VIDAL, Laurent; LUCA, Tania Regina. Franceses no Brasil: séculos XIX-XX. São Paulo: Unesp, 2009. p. 193-208.

CALMON, Pedro. História social do Brasil. v. 2. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

EDMUNDO, Luiz. Rio de Janeiro do meu tempo. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2003. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/1071. Acesso em: 6 jun. 2024.

EL-KAREH, Almir Chaiban. As artimanhas do Braguinha e a ‘invenção’ do cafezinho. In: PRADO, Shirley Donizete et al. Sabor metrópole. Rio de Janeiro: Eduerj, 2016. p. 125-160. Disponível em: https://books.scielo.org/id/37nz2/pdf/prado-9788575114568-07.pdf. Acesso em: 30 nov. 2023.

EL-KAREH, Almir Chaiban. A vitória da feijoada. Niterói: Editora da UFF, 2012.

FERREIRA, Natânia Silvia. O consumo na capital criada nos anseios da modernidade da Primeira República: Belo Horizonte (1894-1930). Tese (Doutorado em História Econômica – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2022.

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Cia das Letras, 2007 [1948].

FLÉCHET, Anaïs. Offenbach au Brésil : l’art de la parodie. Les Cahiers Sirice, [s.l.], v. 24, n. 1, p. 17-28, 2020. Disponível em: https://www.cairn.info/revue-les-cahiers-sirice-2020-1-page-17.htm?ref=doi. Acesso em: 6 jun. 2024.

HEISE, Ulla. Coffee and coffee houses. Schiffer Publishing, 1987.

JESUS, Ronaldo Pereira. A revolta do vintém e a crise na monarquia. Revista História Social, [s.l.], v. 12, 2006. Disponível em: https://ojs.ifch.unicamp.br/index.php/rhs/article/download/197/189. Acesso em: 30 nov. 2023.

LEMAIRE, Gerard-Georges. Les cafés littéraires. Paris: La Différence, 2016.

MAIA, Luis de Araújo Maia; CHAO, Adelaide Rocha de la Torre. Boticas, butiquinhas, botecos, botequins: sociabilidades e comensalidades dos espaços de lazer popular do moderno Rio de Janeiro. In: BARCELLOS, Daniela Menezes Neiva. Consumos alimentares em cenários urbanos: múltiplos olhares. Rio de Janeiro: Eduerj, 2020. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/logos/article/download/35908/28044. Acesso em: 30 nov. 2023.

MENESES, Lená Medeiros de. Francesas no Rio Imperial: a ‘França Antártica’ no feminino plural. Rio de Janeiro: Editora Ayran, 2024.

MENESES, Lená Medeiros de. (Re)inventando a noite: o Alcazar Lyrique e a cocotte comédiénne no Rio de Janeiro oitocentista. Revista Rio de Janeiro, [s.l.], n. 20-21, jan./dez. 2007. Disponível em: http://www.forumrio.uerj.br/documentos/revista_20-21/Cap-5-Lena_Menezes.pdf. Acesso em: 6 jun. 2024.

MENDES, Nuno Fernando Ferreira. Cafés históricos do porto: na demanda de um património ignoto. Dissertação de 2º Ciclo de Estudos em História da Arte Portuguesa, 2012. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/66775?locale=pt. Acesso em: 25 jul. 2024.

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA. Brasil é o maior produtor mundial e o segundo maior consumidor de café, 2023. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/noticias/brasil-e-o-maior-produtor-mundial-e-o-segundo-maior-consumidor-de-cafe#:~:text=Segundo%20a%20Organiza%C3%A7%C3%A3o%20Internacional%20do,atr%C3%A1s%20somente%20dos%20Estados%20Unidos. Acesso em: 6 jun. 2024.

MONTELEONE, Joana. Sabores urbanos: alimentação, sociabilidade e consumo (São Paulo 1828-1910). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), São Paulo, 2008. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-29032010-152753/publico/2008_JoanadeMoraesMonteleone.pdf. Acesso em: 25 jul. 2024.

NUNES, Rosada Barbosa. Imigração portuguesa para o Rio de Janeiro na primeira metade do século XIX. História & Ensino, [s.l.], v. 6, p. 163-177, 2000. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/histensino/article/view/12397. Acesso em: 6 maio 2024.

OLIVEIRA, Milena Fernandes de. Consumo e cultura material, São Paulo “Belle Époque” (1890-1915). Tese (Doutorado em História Econômica) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009.

RIBEIRO, Fernando. A política econômica e o convênio de Taubaté na economia cafeeira (1889-1906). Pesquisa & debate, São Paulo, v. 22, n. 1-39, p. 75-93, 2011. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/rpe/article/download/7390/5363/18046. Acesso em: 30 nov. 2023.

RODRIGUES, Antônio Edmilson Martins; FREIRE, Renato. Confeitaria Colombo: sabores de uma cidade. Rio de Janeiro: Edições Rio de Janeiro, 2014.

Recebido em 30/11/2023

Aprovado em 24/5/2024


Notas

1 Os preços do cafezinho apresentados neste artigo são corroborados pela pesquisa de anúncios de botequins e cafés em jornais e periódicos entre 1840 e 1940. Entende-se o preço de dois/três vinténs ou um tostão a partir de um conjunto de anúncios que, repetidamente, apresentavam os mesmos preços para o artigo de consumo citado.

2 É importante ressaltar que nenhum estudo foi feito a respeito do surgimento e mercado das primeiras torrefações de café do Rio de Janeiro. Sabe-se que pequenas fábricas de torrar e moer café existiam na cidade desde pelo menos a década de 1840 e, apesar de alimentarem também um crescente consumo doméstico, a documentação leva a crer que sua multiplicação está muito mais relacionada ao crescimento do consumo público.

3 Segundo matéria do jornal Diário da Noite de 1937, eram seus assíduos frequentadores na passagem do século XIX para o XX Paula Ney, Olavo Bilac, Coelho Neto, Raymundo Corrêa, Emílio de Menezes, Raul Pederneiras, Alberico Albuquerque, Felix Pacheco, entre outros (Diário da Noite, 1937, p. 9).

4 “Segundo a Organização Internacional do Café (OIC), o mundo produziu, entre outubro de 2021 e setembro de 2022, 170,83 milhões de sacas de 60 quilos e consumiu 164,9 milhões de sacas. O Brasil é o segundo maior consumidor de café no mundo, atrás somente dos Estados Unidos” (Ministério da Agricultura e Pecuária, 2023).

5 As características apresentadas neste parágrafo foram notadas em jornais e periódicos do Rio de Janeiro entre 1840 a 1940, principalmente em anúncios de leilões de botequins, cafés e confeitarias que, após seu fechamento, descreviam os pertences do estabelecimento a serem vendidos. Outro importante elemento para entender os espaços internos desses locais foram anúncios e ilustrações.

6 Apesar da bibliografia consultada apresentar essa imagem desses primeiros cafés, herdeiros diretos dos botequins, é de se questionar que estes locais fossem frequentados por escravizados com circulação em busca de alimentos ou outras transações para seus senhores ou para quem quer que trabalhassem (quando em jornais por ganho). Mesmo que esteja correta esta perspectiva, é relevante a ocupação desses locais por escravizados e consumo destes com excedentes de seus ganhos em trabalhos pela cidade.

7 Determinou-se este dado com criteriosa busca do nome em jornais e periódicos da Hemeroteca da Biblioteca Nacional, possíveis desambiguações e cruzamentos com dados que pudessem confirmar origem, tais como: casamentos, epitáfios ou demais textos que dissessem explicitamente a nacionalidade indicada. Além disso, é importante ressaltar que entre os de nação indeterminada existem diversos nomes que poderiam ser de origem portuguesa, o que pode equivaler em quantidade aos proprietários franceses.

8 Todos os dados dos últimos dois parágrafos foram coletados pela tabulação sistemática das ocorrências da seção Cafés, Botequins, Cafés, etc. do Almanaque Laemmert entre os anos 1844 e 1870, disponível na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

9 A ideia de que um estabelecimento pudesse ser frequentado por mulheres categorizado como “para famílias” foi uma ideia mantida ao longo de todo o século XIX e parte do século XX, sendo identificada com a expansão desse tipo de negócio em outras partes do Brasil (Ferreira, 2022, p.142; 234).

10 Não existem trabalhos relativos a esses “cafés de uma porta”, mas anúncios do tipo eram muito comuns na virada do século XIX para o século XX. A dica sobre a existência desse tipo de estabelecimento foi passada para o autor pelo pesquisador e amigo Antônio Edmilson Martins Rodrigues, ao qual agradeço. Cf. “TRASPASSA-SE um café de uma porta em ponto central; informa-se na rua da Prainha n.115” (Jornal do Brasil, 1900, p. 4).

11 Algumas fontes para São Paulo e Porto Alegre podem ser checadas nas seguintes manchetes: “Reação popular contra o aumento do ‘cafésinho’; PORTO ALEGRE, 12 (Meridional) – Continua a sabotagem do povo aos estabelecimentos que elevaram o preço do ‘cafesinho’.”; “Depredado o café Paraventi porque aumentou o preço do cafezinho!” (O Jornal, 1943, p. 9; Correio Paulistano, 1947, p. 12).


Esta obra está licenciada com uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.