Acervo, Rio de Janeiro, v. 37, n. 1, jan./abr. 2024

Memória e história: potências e tensões nos usos de acervos privados | Dossiê Temático

Contribuições do arquivo pessoal de Zila Mamede para a história da Biblioteca Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Contributions of the personal archive of Zila Mamede to the history of the Central Library of the Federal University of Rio Grande do Norte / Contribuciones del archivo personal de Zila Mamede a la historia de la Biblioteca Central de la Universidad Federal do Rio Grande do Norte

Patricia Ladeira Penna Macêdo

Doutora em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Fluminense (UFF). Professora do curso de Arquivologia e do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Documentos e Arquivos da Universidade Federal do Estado
do Rio de Janeiro (Unirio), Brasil.

patricia.macedo@unirio.br

Jacqueline Araújo Cunha

Mestra em Ciência da Informação pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e doutoranda em Ciência da Informação pelo convênio entre o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ibict/UFRJ), Brasil.

jacqueline.cunha@ufrn.br

Resumo

Apresenta o arquivo pessoal de Zila da Costa Mamede, atualmente custodiado na Biblioteca Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, no qual foram identificados documentos relacionados à estruturação e à formação do acervo da instituição. A partir de uma pesquisa bibliográfica e documental, foi realizada uma análise das portarias presentes no acervo, o que nos permitiu demonstrar a riqueza dos arquivos pessoais ao revelarem entendimentos sociais que transcendem a esfera individual.

Palavras-chave: arquivo pessoal; Zila Mamede; Biblioteca Central Zila Mamede.

Abstract

Presents the personal archive of Zila da Costa Mamede, currently under the custody of the Central Library of the Federal University of Rio Grande do Norte, where documents related to the structuring and formation of the institution’s collection have been identified. Using the methodology of bibliographical and documentary research, an analysis of the ordinances present in the archive was conducted, allowing us to demonstrate the richness of personal archives in revealing social understandings that transcend the individual sphere.

Keywords: personal archive; Zila Mamede; Zila Mamede Central Libray.

Resumen

Presenta el archivo personal de Zila da Costa Mamede, actualmente custodiado en la Biblioteca Central de la Universidad Federal de Rio Grande do Norte, donde se han identificado documentos relacionados con la estructuración y formación del acervo de la institución. Utilizando la metodología de investigación bibliográfica y documental, se realizó un análisis de las disposiciones presentes en el archivo, lo que nos permitió demostrar la riqueza de los archivos personales al revelar comprensiones sociales que trascienden la esfera individual.

Palabras clave: archivo personal; Zila Mamede; Biblioteca Central Zila Mamede.

Introdução

A necessidade individual de criar documentos para referências diárias, para sustentar a memória pessoal, para interagir na sociedade e também para ser lembrado, possibilitou a existência do que hoje se denominam arquivos pessoais. Enquanto produto de atividades dos indivíduos, os documentos pessoais representam as relações sociais, políticas, econômicas e afetivas construídas ao longo da vida.

Nesses arquivos, encontram-se registros de transações de negócios, documentos fruto da relação do indivíduo com o Estado, das suas atividades profissionais, religiosas, públicas, bem como de seus hobbies e interesses, o que, segundo Catherine Hobbs (2001, p. 127), seriam os fragmentos da vida e dos relacionamentos, representados na forma documental.

Por conterem documentos que atendem a necessidades, predileções e personalidades, os arquivos pessoais demonstram a visão pessoal das experiências da vida. Ao produzir documentos que espelham suas atividades “externas”, ou seja, suas relações sociais, o indivíduo cria uma personalidade pública marcada por conexões e interações. Nesse sentido, Macêdo (2018, p. 88) acrescenta que

Documentos são criados e conservados como instrumentos de reconhecimento e afirmação da identidade individual. Nesse sentido, visam regular o cotidiano e servir ao futuro. Por isso, reflexões pessoais tornam-se fontes úteis para perspectivas sociológicas maiores. Na verdade, trabalhar com os arquivos de indivíduos não é apenas lembrar o modo como o indivíduo se encaixa na sociedade, mas como muitos indivíduos participam de um mesmo jogo de regras, saberes e práticas disseminadas socialmente.

Nessa perspectiva, a atividade de recordar aquilo que é significativo para o indivíduo produz uma coleção mental de impressões, reminiscências e memórias. Os documentos criados por pessoas e mantidos em seus arquivos auxiliam o lembrar e, ao lado de acervos de origem institucional, ampliam as narrativas contadas a partir do discurso pessoal.

Isso porque as trajetórias das diferentes organizações, sejam empresas ou equipamentos sociais, geram ao longo de suas existências uma série de registros, dos mais variados suportes e formatos, que se configuram como verdadeiros vestígios de sua memória. De acordo com Costa (1997, p. 145), tal memória é o dispositivo por meio do qual as instituições se reproduzem em sociedade, “retendo apenas as informações que interessam ao seu funcionamento”. A autora acrescenta que os indivíduos são os grandes responsáveis pela construção das memórias institucionais.

É nesse contexto que se insere o arquivo de Zila da Costa Mamede, bibliotecária, professora e poetisa. Reconhecida como a primeira bibliotecária do estado do Rio Grande do Norte, foi responsável por conceber e organizar a Biblioteca Central da universidade do referido estado, instituição da qual foi diretora por 21 anos (1959-1980). Entre suas atividades nessa instituição, Zila Mamede planejou, implantou e renovou, sistematicamente, todos os serviços relativos ao trabalho biblioteconômico, inclusive a própria formação do acervo bibliográfico.

Os documentos presentes nos arquivos pessoais de Zila Mamede, atualmente custodiados na Biblioteca Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), que, inclusive, leva seu nome, refletem sua atividade como bibliotecária, poeta, jornalista e pesquisadora. Esses documentos nos permitem entender sua trajetória profissional e intelectual, possibilitando compreender melhor suas escolhas, interesses e contribuições para a formação e criação da atual Biblioteca Central Zila Mamede (BCZM).

Diante do exposto, este artigo tem por objetivo destacar como o arquivo pessoal de Zila Mamede revela o momento inicial da história da BCZM, isto é, de sua institucionalização como espaço de apoio às atividades de ensino, pesquisa e extensão da UFRN, fornecendo informações que complementam e até suprem a falta de documentos oficiais da universidade, os quais deveriam estar custodiados no seu Arquivo Central.

Nessa perspectiva, foi adotada como procedimento metodológico a pesquisa bibliográfica e documental, sendo a primeira realizada no catálogo da biblioteca e nos repositórios de teses e dissertações. Esta serviu para a construção do referencial teórico adotado na elaboração deste artigo. Já a pesquisa documental foi feita a partir do recorte documental composto por um conjunto de seis portarias, as quais serão apresentadas no decurso do texto. O acesso foi presencial, a partir do acervo da Sala Zila Mamede, localizada na Biblioteca Central da UFRN, fase que contou com o apoio das bibliotecárias do setor na localização e acesso aos documentos, uma vez que ainda não estão em livre acesso.

Dessa forma, espera-se como resultados não só demonstrar a importância histórica dos documentos analisados, mas também contribuir para o entendimento da relevância dos arquivos pessoais na preservação da história e no enriquecimento das narrativas sociais, proporcionando uma visão abrangente da vida e das realizações da bibliotecária pioneira na cidade de Natal.

Arquivos pessoais: o indivíduo e suas atividades

Quando abordamos arquivos pessoais, não nos limitamos aos chamados “egodocumentos”,1 que incluem materiais íntimos e relacionados à esfera pessoal, como diários, cartas, memórias, álbuns de fotografias pessoais e registros de viagens. Na verdade, estamos diante de uma ampla e diversificada gama de documentos, abarcando aspectos da vida social e comunitária, tais como: convites para eventos, agendas de compromissos e registros de associações e clubes. Além disso, é comum encontrarmos documentos de natureza profissional, como relatórios de trabalho, correspondência relacionada a atividades profissionais, projetos desenvolvidos, artigos, trabalhos acadêmicos e registros de participação em eventos e conferências. Essa variedade de materiais possibilita uma visão mais abrangente da vida e das contribuições dos produtores desses arquivos para a sociedade.

De fato, no contexto dos arquivos pessoais, as fronteiras que separam as diferentes esferas de ação de um indivíduo são sutis e imprecisas. Conforme apontado por Silva (2021), os limites entre o pessoal e o institucional nos documentos produzidos no cotidiano de trabalho não apenas carecem de uma definição clara, mas também se revelam extremamente difíceis de serem traçados. Principalmente em razão de o próprio titular muitas vezes confundir o que é privado com o que é proveniente de sua atuação na instituição, e que por isso a ela pertence.

É bastante comum encontrar documentação de caráter administrativo, de pesquisa, científico e tecnológico em acervos pessoais preservados por instituições custodiadoras. Essa interseção de elementos distintos confere aos arquivos pessoais uma natureza rica e diversificada, como mencionado anteriormente.

No arquivo pessoal de Zila Mamede, ao lado de suas correspondências pessoais enviadas/recebidas, cartões-postais, coleção de fotografias, é possível encontrar registros relativos ao desenvolvimento e atualização do acervo da então Biblioteca Central, documentos estes que nos permitem ter uma visão de sua atuação nesse momento inicial tão importante para a história da BCZM e que, inclusive, não está registrada nos próprios documentos oficiais da instituição.

O referido acervo de Zila encontra-se atualmente custodiado na BCZM, após doação feita por familiares à biblioteca. Esta, por sua vez, mesmo sendo uma biblioteca universitária, acolheu a coleção, especialmente por entender tratar-se de um conjunto documental colecionado pela sua fundadora, sobre quem discorremos a seguir.

Zila Mamede e uma vida dedicada à literatura e à biblioteconomia

Zila da Costa Mamede nasceu na pequena cidade de Nova Palmeira, no estado da Paraíba. No entanto, ainda na infância, mudou-se para o Rio Grande do Norte (RN) e chegou em Natal no ano de 1942, no período em que a base aérea de Parnamirim estava sendo construída, devido à Segunda Guerra Mundial. Em 1946, concluiu sua formação como auxiliar de escritório e, posteriormente, ingressou no curso técnico de contabilidade, apesar de não ter sido sua escolha inicial, como ela mesma afirmou: “Eu queria estudar literatura e tive que estudar contabilidade, porque eu precisava de um emprego. Meu pai, já naquela época, tinha a sabedoria de que literatura não dava emprego a ninguém, e me botou para estudar contabilidade” (Mamede, 1987, p. 27).

Foi em 1954 que a biblioteconomia cruzou o caminho de Zila Mamede, quando recebeu um convite para assumir o cargo de auxiliar de biblioteca no Instituto de Educação do Rio Grande do Norte, atualmente conhecido como Colégio Estadual do Atheneu Norte-Riograndense (Figueiredo, 2019). Convidada pelo governador Sílvio Piza Pedrosa (1951-1956), assumiu a direção dessa biblioteca, permanecendo nesse cargo até 1962.

Com o objetivo de se qualificar para essa posição, Zila da Costa Mamede participou do 1º Congresso de Biblioteconomia, realizado em Recife, e integrou a turma do Curso Intensivo de Biblioteconomia voltado à Assistência Técnica às Bibliotecas Brasileiras, promovido pelo Instituto Nacional do Livro (INL), em 1954.

Dando sequência à sua trajetória profissional e por ter se destacado como a primeira aluna da turma do curso organizado pelo INL, foi agraciada com uma bolsa de estudos para frequentar o Curso Superior de Biblioteconomia, promovido pela Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, entre 1955 e 1956. Segundo Monteiro (2021), essa bolsa foi obtida com a intermediação do poeta e escritor Manuel Bandeira, amigo e conselheiro pessoal de Zila.

Logo após se formar, retorna para Natal como a primeira bibliotecária do estado e assume ao longo dos anos uma série de empregos relacionados ao mundo das bibliotecas e dos livros. Em 1960, foi indicada pelo então governador Dinarte de Medeiros Mariz para compor o Conselho Estadual de Cultura do Rio Grande do Norte. Em 2 de maio de 1959, após o Conselho Universitário aprovar a instalação do Serviço Central de Bibliotecas na recém-criada Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Zila Mamede assumiu como diretora da unidade.

O referido serviço consistia da coordenação das atividades das Bibliotecas das Faculdades Isoladas, cujos acervos eram armazenados de forma precária, sem organização e controle, acarretando o extravio de parte do acervo pela não devolução dos empréstimos ou falta de manutenção. (Cunha; Reis, 2018, p. 76)

Após assumir o cargo e buscando se capacitar, e também formar um corpo profissional competente para atuar na biblioteca da UFRN, Zila realizou estágio no Washington International Center (6 a 16 de abril de 1961) e na biblioteca da Syracuse University (17 a 30 de novembro de 1961), nos Estados Unidos. Em 1964, ingressou no curso de mestrado na Universidade de Brasília, porém não o concluiu, em razão de ter sido suspenso no final de 1965 “devido à instabilidade política que tanto afetou a universidade na época” (Mueller, 1985, p. 11).

Além de buscar meios para aprimorar seus conhecimentos teóricos e práticos, Zila também desempenhou um papel fundamental na capacitação e formação de profissionais para atuar nas escassas bibliotecas existentes em Natal até então, conforme mencionado por Cunha e Reis (2018).

Em 1959, ministrou o primeiro curso de biblioteconomia, uma iniciativa promovida pelo Programa de Extensão Universitária da Faculdade de Filosofia de Natal, então parte da Universidade do Rio Grande do Norte (URN). Nesse mesmo ano, Zila assumiu a chefia do Serviço Central de Bibliotecas (SCB) da instituição, uma posição de confiança que exigia competência técnico-administrativa para gerir os acervos das bibliotecas preexistentes: as dos cursos de Farmácia e Odontologia, e de Direito; e dos setores agregados de Medicina, Filosofia e Serviço Social (Monteiro, 2021).

Vale ainda mencionar que se confere a Zila Mamede o mérito pela concepção e implementação do projeto de criação da Biblioteca Pública do Estado do Rio Grande do Norte, hoje conhecida como Biblioteca Pública Câmara Cascudo. De acordo com Marise Castro (2011), tratava-se de um projeto bastante arrojado:

O programa de construção da Biblioteca Pública do Estado, além do salão de leitura com capacidade para 120 leitores e da discoteca com 10 cabines individuais e um auditório, previa sala especial destinada ao trabalho de pesquisadores, salão de exposições, auditório e apartamento para hospedagem dos convidados da instituição. Incluía ainda duas bibliotecas itinerantes: uma para o público infantil e outra para o público adulto. (Castro, 2011, p. 43)

No arquivo pessoal de Zila Mamede, é possível identificar documentos que se relacionam a todos os eventos apresentados acima. Esse acervo é composto por uma variedade de documentos oficiais, tais como declarações, ofícios e solicitações emitidas ou destinadas às bibliotecas visitadas. Além disso, destacam-se registros de hospedagem em hotéis, originais de bilhetes, comprovantes de embarque e despacho de bagagem, envio e recebimento de correspondência, bem como fotografias de reuniões e encontros entre Zila e as equipes de funcionários das instituições visitadas. Esses registros constituem um valioso testemunho das atividades e experiências vivenciadas por Zila durante suas diversas empreitadas profissionais e acadêmicas.

A riqueza dos detalhes existentes nesses registros se configura como fonte de pesquisa tanto para os pesquisadores dedicados ao estudo da vida e obra de Zila Mamede, quanto para aqueles que desejem compreender o contexto histórico no qual surgiram as primeiras bibliotecas públicas na cidade de Natal, a primeira biblioteca universitária e a oferta de formação de auxiliares de biblioteca e bibliotecários no estado do Rio Grande do Norte. (Cunha; Reis, 2018, p. 79-80)

Nessa perspectiva, evidencia-se nos registros históricos e pessoais de Zila uma vida dedicada aos livros e às pesquisas, sendo também responsável por planejar, instalar e organizar, como vimos, a maior e mais significativa biblioteca do estado do Rio Grande do Norte, notadamente a Biblioteca Central da UFRN, que desempenha, até hoje, um papel fundamental no contexto da cidade de Natal.

A Biblioteca Central Zila Mamede oferece um acervo vasto e diversificado, que contempla inúmeras tipologias documentais e abrange as diversas áreas do saber. Sua relevância transcende o contexto acadêmico, configurando-se como centro de conhecimento e cultura para a sociedade em geral.

Biblioteca Central Zila Mamede: conhecimento e memória

Criado em 2 de maio de 1959, o Serviço Central de Bibliotecas foi estabelecido pelo Conselho Universitário (resolução n. 14, de 2 de maio de 1959) com o objetivo de coordenar todas as bibliotecas setoriais das escolas e faculdades que faziam parte da Universidade do Rio Grande do Norte. Na mesma data, Zila Mamede foi nomeada diretora pelo reitor, dr. Onofre Lopes da Silva, e incumbida da “estruturação, dinamicidade e organicidade” do serviço, conforme afirma Marques (2015, p. 49).

A missão de estruturar o serviço de bibliotecas da universidade foi assumida por Zila e o resultado pode ser constatado a partir da cronologia da própria biblioteca. Vale ressaltar que a nomeação de Zila para esse importante cargo universitário se deu em virtude do reconhecimento de sua competência profissional e intelectual no contexto da cidade de Natal.

De acordo com o site da BCZM, passados 15 anos da criação do Serviço Central de Bibliotecas é que foi instituída a Biblioteca Central da UFRN, o que aconteceu no contexto da reforma universitária, em 24 de junho de 1974. Nesse mesmo ano, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da universidade aprova o “Guia regulamento” da biblioteca, configurando-se este, provavelmente, como o primeiro documento com normas e padrões oficiais para o funcionamento da recém-criada Biblioteca Central.

No ano seguinte, a biblioteca passa a ocupar a edificação que fora projetada para acomodar seus serviços e acervos. Naquele momento inicial, o espaço era também dividido com a reitoria da universidade, uma vez que o conjunto arquitetônico da reitoria só ficou pronto em 1975, ano de sua mudança e da ocupação completa do espaço pela biblioteca. A concepção da estrutura predial da biblioteca teve a participação efetiva de Zila, que acompanhava o funcionamento de todos os serviços e a acomodação do acervo, a partir de criteriosas escolhas baseadas no que havia de mais moderno na época.

A edificação contava, inicialmente, com uma área total de 3.737,22 m², que foi ampliada em duas oportunidades: em 1983, sob a gestão do reitor Diógenes da Cunha Lima, passando a ocupar 4.937,32 m², e mais recentemente, em 2011, a partir da construção do anexo que quase dobrou a área ocupada pela instituição, passando para 8.586,49 m², na gestão do reitor José Ivonildo do Rêgo.

Durante os 21 anos em que atuou como diretora da Biblioteca Central da UFRN, Zila Mamede contribuiu efetivamente no estabelecimento de uma instituição sólida e respeitada na universidade, e foi também inspiração para todas as diretoras que a sucederam no cargo e que deram continuidade ao esforço de manter a biblioteca atualizada e sempre buscando melhorar os serviços prestados à comunidade.

A biblioteca foi ampliada não somente em sua estrutura física, como mencionado, mas ao longo de sua existência assessorou a criação de bibliotecas menores distribuídas em todos os campi da universidade, e hoje coordena 24 unidades, denominadas bibliotecas setoriais, as quais compõem o atual Sistema de Bibliotecas da UFRN (Sisbi).

Em reconhecimento à trajetória profissional e às contribuições de Zila Mamede, a universidade, no ano de 1985, logo após seu falecimento, modifica o nome da Biblioteca Central da UFRN para Biblioteca Central Zila Mamede (BCZM), por decisão do Conselho Universitário (Consuni).2

Atualmente, enquanto unidade suplementar diretamente subordinada à Reitoria, a biblioteca destaca-se por subsidiar as atividades relacionadas ao ensino, pesquisa e extensão, contribuindo com suporte informacional e geração de serviços, preocupando-se, inclusive, com questões de acessibilidade, o que foi possível com a criação do Laboratório de Acessibilidade da UFRN, que se dedica à adaptação dos materiais informacionais para os alunos com necessidades educacionais especiais (Universidade..., 2013).

De acordo com o site da biblioteca,3 seu acervo possui 455 mil volumes distribuídos entre livros, folhetos, periódicos, teses, dissertações e multimeios, além de 4.994 livros digitais de diferentes áreas do conhecimento. Tais números conferem à BCZM uma posição de destaque como centro de conhecimento e referência para a comunidade acadêmica e para a sociedade em geral no Rio Grande do Norte.

O acervo da Biblioteca Central Zila Mamede, por seu potencial de pesquisa, identidade, história e memória, preserva também o conjunto documental pessoal de Zila Mamede, que atualmente encontra-se sob responsabilidade do Setor de Coleções Especiais, responsável por “obras cujo valor patrimonial, memorial e cultural requer tratamento e armazenamento especial” (Universidade..., 2021, p. 5).

Nesse sentido, a BCZM disponibiliza à comunidade acadêmica e externa a consulta desse acervo especial, de forma que o pesquisador/estudante pode ter acesso a documentos que dizem sobre o contexto sociocultural que Zila Mamede viveu e ajudou a construir.

O arquivo Zila Mamede e a história da formação da Biblioteca Central da UFRN

O arquivo pessoal de Zila Mamede, ao qual se refere este trabalho, constitui-se em um acervo que começou a chegar à BCZM em 1985, logo após sua morte, e está disponibilizado em uma sala criada em sua homenagem, a Sala Zila Mamede. Configura-se como um espaço destinado a abrigar o acervo pessoal de Zila e foi inaugurado em março de 2016 com o objetivo de, além de salvaguardar os seus itens, representar como era seu próprio espaço de trabalho dentro da biblioteca.

Possui atualmente 1.213 livros, 1.037 documentos e alguns objetos usados por Zila, quando ainda era diretora da biblioteca, como a mesa onde ela trabalhava, sua máquina de datilografar e carteiras funcionais. Segundo a bibliotecária Tércia Marques, uma das responsáveis pelo setor, “a ideia é que o pesquisador de Zila Mamede faça um tour ao adentrar as memórias dela aqui nesta sala. Temos os livros que ela leu, os que ela escreveu, os que já foram escritos sobre ela” (Almeida, 2019, s.p.).

O referido acervo, portanto, enquanto conjunto de bens que representam a história e a memória de um determinado local, sua cultura e identidade, foi preservado e nos dá a possibilidade de entender dinâmicas sociais, políticas e administrativas que muitas vezes não estão descritas e presentes em documentos oficiais. Essa constatação contribui para o entendimento de que

Os arquivos pessoais refletem, por meio de seus documentos, as atividades e funções sociais de seus produtores ao longo de suas vidas e também, por consequência, de seus interlocutores. São registros de ações e relações familiares, sociais, afetivas, políticas, intelectuais, de negócios e tantas outras também criadas para instrumentalizar a vida de um indivíduo em sociedade. (Oliveira; Macêdo; Sobral, 2017, p. 3)

No conjunto documental produzido por Zila ao longo de sua vida, observam-se documentos que dizem respeito às atividades profissionais por ela desempenhadas. Em análise in loco do seu acervo, localizaram-se livros, periódicos, cartas, relatórios, resoluções, portarias, diários de viagens, fotografias, diplomas, originais de pesquisas e outros materiais.

Nos documentos institucionais identificados, é possível atestar que durante os 21 anos em que atuou como diretora da Biblioteca Central da UFRN, Zila Mamede se dedicou a planejar, implantar e renovar sistematicamente todos os serviços relacionados ao trabalho técnico bibliotecário na instituição, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento do acervo bibliográfico, à época imprescindível para manter com qualidade o principal serviço prestado, o empréstimo de livros.

Os desafios encontrados devido à escassez de recursos levaram Zila a adotar algumas estratégias que foram identificadas por Marques (2015) em sua pesquisa de mestrado, entre elas a de estruturar um setor para coordenar as atividades de aquisição de material bibliográfico. Este

destinava-se, a princípio, à aquisição de livros nas áreas do conhecimento das Ciências Humanas e Sociais; Ciências Biomédicas e Ciências Tecnológicas; igualmente à organização dos acervos das bibliotecas das unidades universitárias, para assim proporcionar a sistematização, a tecnicidade e a cientificidade ao trabalho de ensino, pesquisa, além da produção acadêmica e científica de professores e alunos. (Marques, 2015, p. 49)

Outra iniciativa adotada por Zila foi o intercâmbio nacional e internacional, firmado pela própria com instituições universitárias e públicas, nos moldes das universidades americanas, e que possibilitou a chegada de diversos livros, periódicos, obras de referência etc., como, por exemplo, os três livros provenientes da American Library Association, três da Library of Congress e um da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, conforme afirma Tércia Marques (2015), baseando-se em consulta ao próprio acervo pessoal de Zila e às fichas de aquisição da BCZM.

Além dessas ações, o acervo de Zila Mamede documenta processos referentes à aquisição e à proveniência do acervo da Biblioteca Central, que começou a ser formado na década de 1970. Essas informações podem ser verificadas nas portarias em que Zila foi nomeada como integrante de comissões avaliadoras, as quais tinham por finalidade emitir pareceres para subsidiar os processos decisórios sobre a compra de acervos de particulares.

Os relatos históricos sobre o início da BCZM apenas afirmavam que, uma vez constituída a Biblioteca Central, haviam sido reunidos os acervos das faculdades isoladas, que por sua vez originaram a própria universidade. O acervo de Zila documenta, portanto, um segundo momento na constituição desse acervo, que foi a aquisição por compra ou doação, mediante criteriosa avaliação, de acervos de bibliotecas particulares de ex-professores e outros intelectuais do estado do Rio Grande do Norte.

Essa modalidade de aquisição está descrita parcialmente no conjunto de portarias elencadas e analisadas neste trabalho e que nos permitem ilustrar o argumento de que, a partir do arquivo pessoal de Zila, é possível elucidar outros processos que foram adotados durante a formação do acervo da BCZM. Tais documentos nomeiam comissões de avaliação de acervos pessoais, quais sejam, em ordem cronológica, as portarias n. 844/76, n.76/77, n. 483/77, n. 487/77, n. 475/78 e n. 319/79. Como forma de apresentar melhor as informações desses documentos, foi elaborado o Quadro 1, a seguir.

Quadro 1 – Portarias de nomeação de comissões de avaliação de acervos

PORTARIA

DATA

ACERVO AVALIADO

MEMBROS

Portaria n. 844

22/9/1976

Biblioteca particular do professor Esmeraldo Homem de Siqueira

Zila da Costa Mamede (presidente)

Waldson José Bastos Pinheiro (membro)

Yedda Maria Moura Carvalho e Silva (membro)

Portaria n. 76

28/3/1977

Biblioteca particular do ex-professor Edgar Ferreira Barbosa

Otto de Brito Guerra (presidente)

Zila da Costa Mamede (membro)

Waldson José Bastos Pinheiro (membro)

Portaria n. 483

08/11/1977

Livros do espólio de Ewerton Dantas Cortez

Otto de Brito Guerra (presidente)

Zila da Costa Mamede (membro)

Waldson José Bastos Pinheiro (membro)

Portaria n. 487

11/11/1977

Livros pertencentes ao professor José Bonifácio de Carvalho

Jacirema da Cunha Tahim (presidente)

Zila da Costa Mamede (membro)

Alcir Leopoldo Dias da Silveira (membro)

Portaria n. 475

11/8/1978

Espólio do desembargador Floriano Cavalcanti de Albuquerque

Otto de Brito Guerra (presidente)

Agnelo Dantas Barreto (membro)

Selma Maria e Sá Bezerra (membro)

Zila da Costa Mamede (membro)

Portaria n. 319

25/5/1979

48 exemplares da professora Olga Barbosa D’Andrea

Waldson José Bastos Pinheiro (presidente)

Zila da Costa Mamede (membro)

Selma Meira e Sá Bezerra (membro)

Fonte: elaborado pelas autoras (2023).

Ao observar o quadro acima é possível fazer algumas considerações sobre o processo inicial de formação da BCZM. A primeira diz respeito à proveniência do acervo, que, além de ser formado pelas faculdades isoladas que deram origem à universidade, também foi adquirido por meio de compra/doação de bibliotecas particulares, de professores ou ex-professores, que sabidamente atuaram nas antigas faculdades de Natal, a exemplo de Esmeraldo Homem de Siqueira, que foi professor da Faculdade de Farmácia e Bioquímica; Edgar Ferreira Barbosa, que tinha sido professor da Faculdade de Direito de Natal; Floriano Cavalcanti de Albuquerque, um dos primeiros professores da Faculdade de Direito, e Olga Barbosa D’Andrea, que foi professora de língua e literatura italiana na Faculdade de Filosofia de Natal.

No que diz respeito à formação das comissões, mesmo sendo Zila uma profissional graduada e responsável pelo serviço de biblioteca, unidade suplementar da universidade, poucas vezes presidiu as comissões, tendo os docentes majoritariamente assumido essa função. O professor Otto de Brito Guerra, que assume a presidência da maioria das comissões, era advogado e ocupou importantes cargos na instituição, inclusive foi vice-reitor por ocasião da federalização da universidade. Foi homenageado com o título de professor emérito pela universidade, no ano de 1981, além de ter recebido duas medalhas de mérito universitário.

Mesmo não sendo esse o foco da discussão neste momento, essa constatação ilustra de alguma forma como se davam as relações de poder e autoridade existentes nos espaços universitários.

Essa prática de aquisição de bibliotecas particulares na formação dos acervos de bibliotecas universitárias foi bastante comum no passado, quase um processo natural na história das bibliotecas, nas palavras de Leipnitz (2017), e continua sendo atualmente um processo importante de aquisição nessas instituições, sendo que agora muito mais por doação do que por compra.

A estratégia de incorporar bibliotecas particulares ampliou o acervo bibliográfico da instituição, ao mesmo tempo que o enriqueceu com obras das mais diversas áreas do conhecimento que foram disponibilizadas para a comunidade acadêmica e o público em geral. De acordo com Marques e Araújo (2020), o quantitativo de obras que foram incorporadas ao acervo girou em torno de 19.391 títulos bibliográficos, os quais versavam, majoritariamente, sobre ciências humanas, música e teatro.

No contexto em que se inserem esses documentos, no qual se buscava formar um acervo para uma biblioteca de uma universidade recém-criada, a aquisição desses acervos particulares foi de especial importância, sobretudo em razão da própria realidade local da cidade de Natal e do estado do Rio Grande do Norte. Nas palavras de Zila Mamede:

Na medida do possível, todo o esforço foi aplicado no sentido de atribuir aos serviços biblioteconômicos desta universidade um cunho moderno atualizado, dentro dos padrões da documentação universal. Entretanto, as limitações de que padecia toda a estrutura universitária, em virtude, sobretudo, de tratar-se de uma instituição recém-criada, muita coisa deixou de ser feita. Mas, dentro do que foi possível realizar, o critério usado foi aquele de “dar o melhor, dentro do pior”, de absoluta fidelidade aos princípios universitários e às condições regionais. (Documento da biblioteca 1959/1978, 1978, fl.1, apud Marques; Araújo, 2020, p. 52)

Como forma de incentivar e estimular o hábito de leitura e o consumo de livros na cidade de Natal, Zila Mamede, conforme apontado por Marques e Araújo (2020, p. 50), priorizava a compra dos livros universitários para o Serviço Central de Bibliotecas em livrarias de Natal, “especialmente na Livraria Universitária, de propriedade do livreiro Walter Pereira”. Essa atitude reforça ainda mais a dedicação e o compromisso social exercido por Zila Mamede, não apenas para a formação do acervo da Biblioteca Central, mas para a promoção cultural e educacional em toda a cidade de Natal e no estado do Rio Grande do Norte.

Diante do exposto, é possível verificar como a possibilidade de trabalhar com fontes documentais de diferentes contextos enriquece os trabalhos de pesquisa, notadamente os arquivos pessoais, muito utilizados por abrigar registros que normalmente não são recolhidos aos arquivos das instituições. Esses documentos, que muito provavelmente foram guardados, por motivos diversos, em residências, servem como testemunho das atividades exercidas e, consequentemente, revelam os meandros das histórias institucionais. Nas palavras de Camargo e Goulart (2007, p. 50):

Os arquivos pessoais de cientistas, artistas e políticos constituem matéria privilegiada para que se possam compreender os processos de conhecimento, criação e decisão, razão por que, aliás, têm sido objeto de iniciativas de recolhimento por instituições diversas.

No âmbito deste artigo, o acervo pessoal de Zila Mamede ganha ainda mais importância e destaque, primeiramente, por ter sido produzido por uma bibliotecária, profissão sem grande destaque social, e, segundo, por representar um arquivo pessoal de uma mulher em um espaço predominantemente dominado por acervos de homens, conforme evidenciado por pesquisas recentes como as de Macêdo (2021), Crivelli e Bizello (2021) e Heymann (2020).

Essa constatação realça a singularidade do acervo de Zila Mamede e sua contribuição na quebra de paradigmas e estereótipos de gênero nas áreas de biblioteconomia e arquivologia. Ao valorizar e preservar o legado de Zila Mamede, aqui representado especialmente pelo recorte do seu arquivo pessoal, estamos não apenas resgatando a memória de uma profissional, mas também fortalecendo a importância de respeitar e valorizar a diversidade de perspectivas e contribuições, tornando-se um exemplo inspirador para futuras gerações de bibliotecários, historiadores e pesquisadores.

No contexto da UFRN, esse arquivo ganha ainda mais importância ao representar também parte da história de sua biblioteca central, órgão essencial para o cumprimento de sua missão institucional. Portanto, o arquivo de Zila Mamede transcende sua relevância meramente histórica e torna-se testemunho da trajetória da Biblioteca Central Zila Mamede e, por que não dizer, da própria UFRN.

Considerações finais

Considerando-se a função da biblioteca universitária, seu acervo normalmente abrange uma vasta gama de materiais e recursos que visam atender às necessidades acadêmicas e intelectuais da comunidade universitária. Composta por uma série de coleções, reflete não apenas as mais recentes descobertas e avanços em diversas áreas do saber, mas também o legado cultural acumulado ao longo do tempo.

Nesse sentido, a biblioteca universitária desempenha um papel fundamental enquanto espaço de aprendizagem, pesquisa e disseminação do conhecimento, promovendo o desenvolvimento acadêmico e contribuindo para a formação integral dos estudantes e pesquisadores. Acrescente-se a isso a função dos acervos de coleções especiais dessas bibliotecas, compostos especialmente por materiais de valor histórico e cultural, que vêm ganhando uma relevância ainda maior para a preservação da memória da ciência, cultura, arte e literatura.

O exemplo do acervo de Zila Mamede custodiado na BCZM ilustra como essas coleções especiais enriquecem o patrimônio intelectual e cultural de uma instituição. O arquivo pessoal de Zila Mamede, contendo documentos que abrangem sua atuação como bibliotecária, professora, poetisa e pesquisadora, desempenha um papel essencial ao registrar não apenas suas contribuições individuais, mas também as interações sociais e culturais da época em que viveu.

Enquanto fenômeno social, arquivos pessoais revelam-se como fontes importantes para a construção de memórias individuais e coletivas. Por meio desses documentos, podemos vislumbrar as nuances da vida de indivíduos e compreender suas relações sociais, culturais e profissionais, revelando histórias que se entrelaçam com o contexto histórico e cultural de uma sociedade e de suas instituições.

As portarias analisadas neste artigo, que se encontram no contexto de um conjunto pessoal, demonstram o potencial deste acervo em contar a história da própria biblioteca e complementam, inclusive, as narrativas oficiais sobre a formação do acervo da BCZM.

Ao preservar e disseminar as histórias contidas no arquivo pessoal de Zila Mamede, estamos enriquecendo nossa compreensão do passado para fins de memória e identidade. Ao mesmo tempo, a existência de acervos como esse nos mostra a necessidade de ampliar e diversificar as narrativas históricas e culturais.

Para finalizar, é importante dizer que a história oficial foi contada sob a perspectiva de grupos dominantes, marcadamente por vozes que não dão conta da nossa diversidade social e cultural. Dessa forma, buscou-se abrir o caminho para uma história mais inclusiva e representativa, bem como evidenciar o potencial revelador que esses acervos têm de elucidar os meandros das histórias institucionais.

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1 O termo “egodocumento” é definido no livro Tempo e circunstância, de 2007, de Ana Camargo e Silvana Goulart, e refere-se a documentos oriundos do espaço doméstico e que apresentam elementos da personalidade do produtor do arquivo.

2 Resolução n. 120, Consuni, de 9 de dezembro de 1985.

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Recebido em: 29/7/2023

Aprovado em: 18/1/2024


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